(À boleia de uma
excelente crónica de Gavyn Davies no Financial Times, alertando para um importante discurso do vice-presidente
do FED Stanley Fisher, que parece finalmente dar razão aos que vêm no comportamento
das baixas taxas de juro algo mais do que um estado passageiro)
O jornalismo económico tem
dividido os membros do Federal Open Market
Committee (FOMC) responsável pelas decisões de política monetária do FED
USA entre pombas e falcões, associando aos últimos as posições mais duras em
matéria de manipulação das taxas de juro de referência. Os falcões têm-se
movimentado no sentido de impor à presidente Janet Yellen a subida a prazo das
taxas de juro de referência, sob o pressuposto de que o zero lower bound não é mal que sempre dure, sendo necessário evitar
qualquer pressão especulativa que as baixas taxas de juro tendam a gerar. A primeira
subida observada foi fruto dessa pressão e ela tem-se mantido nas sucessivas
reuniões do FOMC, embora a evolução do quadro macroeconómico americano esteja
longe de assegurar a confirmação do padrão ascendente de taxas que os falcões
desejariam impor à economia americana.
Uma das ideias que tem unido
os falcões é a rejeição de fatores de natureza estrutural para explicar o comportamento
em baixa das taxas de juro, incluindo as que descrevem o comportamento das
expectativas a longo prazo em função das antecipações da inflação. Por outras
palavras, a generalidade dos falcões tem-se oposto à tese de que são insuficiências
estruturais de mais largo fôlego que explicam a persistência das baixas taxas
de juro. A tese da estagnação secular, que tantas vezes tem sido citada neste
blogue, causa alergia aos ditos falcões. Sempre viram o “zero lower bound” como algo de circunstancial ou passageiro, embora
o alongamento da dimensão temporal do passageiro tenha provocado dificuldades ao
argumento.
O já mencionado Gavyn
Davies anota no mais recente discurso de Stanley Fisher alguma alteração nessa
perspetiva, sugerindo que o alongamento da dimensão temporal do predomínio de
baixas taxas de juro começa a abrir caminho entre os falcões para acolher na
sua própria avaliação elementos de teor estrutural. A abertura desse caminho
teria de ser soft. Nada melhor do que começar pela influência dos fatores demográficos,
pois a dimensão demográfica não a carga conflitual que outras dimensões estruturais,
tais como a desigualdade, transportam consigo.
O discurso de Stanley Fisher
apoia-se em evidências de investigação de economistas do próprio FED e aponta para
três influências da questão demográfica que cava fundo nas sociedades avançadas
ocidentais.
A primeira influência é
a possibilidade da diminuição dos ritmos de crescimento da força de trabalho alterarem
a relação capital/trabalho, aumentando a abundância relativa do capital
(aumento do rácio) e com isso fazendo diminuir a taxa de retorno do capital,
reduzindo a taxa real de juro que equilibraria a longo prazo a relação entre a
poupança e o investimento.
A segunda influência é
determinada pela eventual diminuição do peso de trabalhadores ativos em relação
à população dependente de jovens e velhos. Como se poupa mais na idade ativa, a
diminuição desse peso pode alterar a taxa de poupança.
A terceira influência aponta
para os efeitos de vidas mais longas que podem impor hábitos de poupança mais
salientes na vida ativa e na reforma, fazendo aumentar a taxa de poupança e
descer a taxa de juro real de equilíbrio.
A demografia é
obviamente um fator estrutural e as evidências de estimação de baixas da taxa
de juro de equilíbrio provocadas por tais efeitos vêm trazer à política monetária
novos cambiantes. O muro da insensibilidade da política monetária a fatores estruturais
parece querer ceder. A negação das evidências seria demasiado ostensiva. Passo a
passo, timidamente é claro, vão sendo criadas condições para uma mais completa
explicação dos atrasos da recuperação pós 2007-2008. De mal o menos.
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