(Por mais que os
mensageiros da oposição, estruturada ou simplesmente porque os atormenta ver a esquerda
a governar, gralhem sem parar, a verdade é que para lá do ruído a mensagem é favorável ao governo)
Não vos sei dizer, pois
não tenho informação para isso, se o resultado encontrado na proposta de orçamento
apresentada no Parlamento e em Bruxelas é fruto essencialmente da equipa de Centeno
nas Finanças ou se, em bom rigor, teríamos de louvar o trabalho de outros membros
do governo. Há quem diga que a presença de António Costa nos últimos momentos
antes do seu encerramento terá sido essencial para fechar negociações à esquerda.
Talvez seja isso que aconteceu e seguramente que tal mensagem está em linha com
a imagem de negociador por excelência que o primeiro-Ministro pretende
disseminar.
Ignoremos por agora as
antecâmaras do documento orçamental e centremo-nos no ruído das mensagens e
discussões que o Orçamento suscitou. E se é verdade que há vida para além do
orçamento, a própria oposição ao morder a isca retira o que está para além do
orçamento da discussão, ao embrenhar-se em algumas batalhas impossíveis.
As discussões que os
mensageiros da oposição têm procurado colocar no centro da comunicação acabam
por ser virtuais. Grande parte das matérias escolhidas para zurzir no orçamento
só assumirão pleno significado quando se perfilarem consumos ou despesas
concretos. Assim, por exemplo, a batalha em torno do aumento de impostos que
este orçamento veiculará não tem resistido aos exercícios globais e de simulações
específicas que os diferentes órgãos de comunicação social têm veiculado. A ideia
dominante, mesmo entre órgãos de comunicação claramente avessos ao governo
atual, é a de que há uma ligeira quebra da carga fiscal e não o seu aumento. Quando
para contrariar esta tónica dominante se leva a discussão para casos muito específicos,
a batalha já está perdida, pois esses casos específicos não cobrem a
generalidade do eleitorado e entram rapidamente no domínio das curiosidades.
Em simultâneo, conseguir
pela primeira vez que o Conselho das Finanças Públicas esteja em comentário de
cruzeiro relativamente ao orçamento, atingir o mais baixo défice da democracia
em cerca de 42 anos, aparentemente colocar a Comissão Europeia em dificuldades
para conseguir mais cortes, receber elogios do BCE, aguentar a notação de risco
e equilibrar sensibilidades no interior da esquerda é obra e será isso que
ficará da discussão nos meios de comunicação e no futuro debate parlamentar.
Como previa, a matéria
que traz mais combustível para a discussão é a das pensões não contributivas. Por
dois motivos. Primeiro, porque governo e oposição devem algumas explicações ao
cidadão que quer ser respeitado. O governo assumiu que entre as pensões não
contributivas mais baixas já teriam sido aumentadas pelo governo PAF e que só
seriam aumentadas as que não correspondessem ao discurso do governo de então. A
secretária de Estado da Segurança Social veio a terreiro afirmar que cerca de 250.000
pensões teriam afinal sido ignoradas pelo governo anterior. A oposição não mugiu
nem tugiu, O assunto não é despiciendo e não pode ser remetido para as
entrelinhas. Desse ruído não purificado, ficam apenas os comentários dos nossos
liberais libertários (hayekianos, assumem a carapuça?), como André Alves no
Observador, aparentemente escandalizados com as opções distributivas do governo
à esquerda em matéria de aumento de pensões. A hipocrisia destes libertários é
aflitiva, pois não os vi preocupados com essa questão em plena ofensiva de
cortes generalizados impostos pela Troika e aplaudidos pelo governo PAF. Segundo
motivo, e de longe o mais importante e decisivo para este blogue, e claramente
apontada a um tempo pós orçamento, a esquerda dá mostras de poder reagir mal à possibilidade
de ser discutida a aplicação de pensões não contributivas à condição de demonstração
de recursos. Um dia depois de alertar para essa questão neste blogue e certamente
por simples coincidência Francisco Louçã foi o primeiro a revelar essa incomodidade,
relembrando ao Bloco as suas linhas vermelhas.
Sou o primeiro a reconhecer
que condição de recursos nas prestações sociais tem anunciado o pior por esse
mundo fora, incluindo o social-democrata. Mas não vejo razão para ser tema tabu,
pelo menos para uma esquerda que rejeite o atavismo.
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