domingo, 28 de maio de 2017

AS IMAGENS DE MILLÁS




(O mito de Narciso aplicado à política salpicada pela corrupção, na prosa implacável e incisiva de Juan José Millás)

O suplemento dominical do El País tem para mim uma coluna de culto. Juan José Millás escolhe imagens e acompanha-as, regra geral, de um texto mortífero, fulminante. Infeliz o(a) fotografado(a), preso na imagem capturada.

Este domingo, o tema é o mito de Narciso aplicado à política salpicada de corrupção. A imagem é um monumento simbólico. Num “despacho” talvez algures na comunidade de Madrid, Esperanza Aguirre, uma estrela refulgente e depois cadente do PP, retoca a maquilhagem (sempre o espelho) perante o olhar embevecido dos seus colaboradores mais diretos, todos a contas com a justiça espanhola, o que determinou aliás a demissão da própria Aguirre.

Espelho meu, espelho meu!

A imagem sobre a qual Millás disserta brevemente levar-nos-ia muito longe. Haverá na corrupção política sempre uma sedução narcísica do eu? Será que a sedução do espelho foi alimentada pelos acólitos e assistentes de Aguirre para trabalharem mais à vontade?

Tal como Millás o assinala na sua curta crónica, a história da mitologia não se confirmou? No local do afogamento de Narciso não apareceu desta vez uma bela flor, mas um poço bem fundo de consequências pestíferas para a causa pública em Espanha.

Quantas Aguirres deste mundo da política corrupta se confortam no espelho perante o ar contemplativo dos seus colaboradores mais íntimos?

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