(Hoje, em Vila
Real, na UTAD, num seminário sobre Euro-regiões e Euro-cidades, oportunidade
para revisitar um tema do qual tenho sido observador-ator e também para
reencontrar alguns amigos também dedicados ao tema)
Estava escrito que a cimeira ibérica de ontem e hoje, dedicada ao tema da
cooperação transfronteiriça, teria que despertar algumas iniciativas sobre a questão.
E, nestas coisas, como não há muita gente a trabalhar sobre as mesmas, a persistência
deste vosso amigo é recompensada.
Há dias fiz uma intervenção na XIª sessão plenária da Comunidade de Trabalho
Galiza Norte de Portugal dando conta dos resultados da avaliação expedita que
me coube realizar do plano de investimentos comuns que as duas regiões elaboraram
no âmbito da programação 2014-2020, por solicitação do AECT Galiza-Norte de
Portugal.
Hoje, de tarde, estarei em Vila Real, na UTAD, para uma intervenção no
seminário “Euro-regiões e Euro-cidades: velhas e novas
centralidades” que um conjunto de investigadores, com apoio da
Unidade de Missão para a Valorização do Interior, dirigida pela Professora Helena
Freitas, que modera a minha sessão, decidiram organizar como iniciativa
complementar à Cimeira Ibérica que apresenta hoje de manhã as suas realizações.
O tema tem sido precedido nos últimos dias por alguma notoriedade na imprensa
escrita. Curiosamente, no Público, a antiga diretora do jornal, a jornalista Bárbara
Reis, falava ontem a propósito da posição portuguesa de um diamante escondido
na fronteira ainda por lapidar, interrogando-se se a Espanha partilha essa visão
de algo oculto que importa valorizar. No mesmo jornal, a Professora Helena
Freitas centrava a sua posição na inevitabilidade da cooperação e concentrava a
sua atenção nos rios de fronteira como o grande potencial a valorizar, e sem
hesitação recentrava a sul a prioridade da futura cooperação falando do
Guadiana como o grande projeto estratégico de cooperação transfronteiriça a desenvolver.
E o Ministro Augusto Santos regressava à visão à Copérnico do interior
anunciando que o interior deve ser visto como um grande centro da Península Ibérica,
uma perspetiva que não é nova, recordo que o Professor Jorge Gaspar, honra lhe
seja feita, fala desta ideia já há muito tempo. Em meu entender, esta
perspetiva pode abrir uma abordagem distinta, mas sem investimento público,
vontade política e atração de pessoas a geoestratégia de mapa não faz o
desenvolvimento. Ou seja, o interior é o centro de uma nova unidade, mas do
ponto de vista das unidades e massas críticas existentes, o interior é o vazio.
E num artigo de opinião claramente alinhado com estas posições, o Professor
António Covas da Universidade do Algarve, que tem ultimamente elaborado e bem
sobre a relevância do digital para a criação de novas centralidades no território,
centrando sobretudo as suas preocupações, que correspondem ao seu trabalho, nas
regiões do Alentejo e do Algarve encaradas como “regiões de transição entre a área metropolitana de Lisboa e a área
metropolitana de Sevilha, um corredor que é preciso conceber e organizar de
modo muito mais imaginativo e prometedor”.
António Covas concentra-se no potencial que as novas tecnologias, as redes
digitais e as plataformas virtuais apresentam para a criação de novas centralidades
complementares da macrorregião peninsular. Apresenta no artigo dez tópicos de
propostas, alguns dos quais estão já assumidos designadamente na cooperação
Galiza-Norte de Portugal. A proposta em torno da inteligência coletiva territorial
de que o entusiasta da cooperação e não tanto o académico tanto gosta de valorizar
peca a meu ver pela utilização indiscriminada de conceitos da economia digital e
atividades associadas desenvolvidos a partir de situações territoriais com
outras massa críticas de recursos humanos, de inteligência e de investimento. Covas
tem razão quando refere que a raia luso-espanhola não é um território vazio de
iniciativa e desprovido de qualquer potencial de intervenção no mercado único
digital em formação. Como ele o refere, institutos politécnicos, associações empresariais
e comunidades intermunicipais são âncoras relevantes para combater a atomização
de recursos. Mas já ando nisto há longos anos para esquecer que as TIC foram em
tempo apontadas como a grande saída para combater o esvaziamento dos territórios
em declínio. O paradigma não é de hoje embora se tenha em conta que a economia
digital constitui um desenvolvimento relevante do mesmo. Mas, mesmo que por via
da revolução digital, os territórios em declínio se mantenham conectados com os
grandes centros de conhecimento, permitindo-lhe alimentar esses mesmos centros,
isso não se faz sem pessoas, qualificações, investimento aí implantados.
Pela minha parte, hoje, serei mais modesto e falarei sobretudo das virtualidades
que a cooperação Galiza-Norte de Portugal apresenta pelo facto de movimentar três
dimensões: a cooperação de Euro-região (inter-regional), a cooperação
territorial de proximidade na qual se podem incluir projetos como a Euro-Cidade
Chaves-Verín e a cooperação interurbana protagonizada pelo resiliente Eixo Atlântico,
cuja coerência de governação é um desafio.
Entretanto, os jornais de hoje, antecipando as declarações conjuntas de fim
de cimeira, falam que Portugal e Espanha irão concorrer juntos aos Fundos
Comunitários, preparando para o próximo período de programação um programa integrado
transfronteiriço para toda a raia luso-espanhola. A ideia de integração é simpática.
Mas conhecendo a cultura centralista que continua a caracterizar o PP em
Espanha e as derivas com tiques centralistas com que por vezes o PS nacional olha
para estas coisas, espero que esse plano integrado não mate as tais energias transfronteiriças
que são diferentes do Norte ao Algarve de fala António Covas no seu artigo. Seria
bom que o governo português se interrogasse por que carga de água o Norte
transfronteiriço mais denso demograficamente que o seu correspondente galego
tem de suportar na cooperação territorial transfronteiriça a regra de 3 € de
FEDER em Espanha para 1 € em Portugal. O Público de hoje fala de “um grupo de trabalho com técnicos
portugueses e espanhóis que, em conjunto, irão preparar o futuro programa de
desenvolvimento transfronteiriço” (…) que “dependerá diretamente do gabinete
dos dois primeiros-ministros”. Oh como eu conheço estes grupos de trabalhos.
Esperemos que a dignificação institucional de elevação para a área de influência
dos primeiros-ministros não signifique incapacidade de compreender a diferenciação
de dinâmicas de cooperação ao longo da fronteira.
Para memória futura.
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