sexta-feira, 14 de maio de 2021

ESTOU COM ANTONIO MUÑOZ MOLINA!

 


(Gosto muito da sensibilidade e do que Muñoz Molina escreve, seja ensaio, seja romance. E convirjo com ele e com o seu desabafo perante o escárnio e maldizer relativo a quem defende os valores essenciais da democracia e da esquerda por mais indefinida esta última possa apresentar-se. Sobretudo quando esse escárnio e maldizer vem de uma direita ululante que em Espanha começa a tomar o pulso à democracia.)

Na sequência do profundo terramoto que as eleições do 4-M representaram, cujas consequências irão, estou seguro, muito além do que a espuma destes dias mais recentes nos desvenda, Molina refere-se a um manifesto de esquerda que assinou entre outros intelectuais, em favor de uma unidade, mesmo que circunstancial, da esquerda fragmentada. A retumbante vitória da direita nessas eleições tendeu a despertar o reavivar de pulsões latentes de uma direita reprimida até então no seu raio de ação. Molina refere-se assim às manifestações, perante a derrota em toda a linha da esquerda, de escárnio e ridicularização de que os signatários desse documento foram alvo, no âmbito do que o escritor espanhol designa ironicamente de “grande gesto de nobreza moral que representa escarnecer dos que perdem”.

Numa empatia singela com alguém de quem se aprecia bastante o que escreve, estou com o escritor espanhol quando escreve na sua crónica do Babelia (El País) (link aqui):

Cada um define-se pelo que afirma, não pelo que nega. Nega-se algo porque se afirma alguma coisa. Negam-se o racismo e a homofobia porque se afirma a igualdade entre as pessoas e o direito a uma vida livre e digna. A liberdade do privilégio do dinheiro não pode ser exercida à custa do direito universal á saúde, á educação, ao ar limpo, á segurança pessoal, à igualdade perante a lei. A OCDE acaba de denunciar que a Espanha é o país da Europa que tem mais escolas gueto, porque os filhos dos mais pobres e dos imigrantes só podem frequentar as escolas públicas mais sobrfelotadas e com poucos meios e não as privadas nem as em parceria, que se financiam com o dinheiro de todos.

Durante todos os anos em que a direita tem governado Madrid o seu empenho constante tem sido o de reduzir o âmbito do ensino público, o mesmo sucedendo com a saúde pública. Bens tão sagrados como a educação e a saúde abrem possibilidades suculentas de negócio privado. Assinei um manifesto e depositei o meu voto em defesa de um conjunto de ideais que cabem numa página, e que são tão pouco revolucionários que deram origem a um consenso da melhor política europeia há quase três quartos de século. Um certo grau de exílio interior não me parece um preço excessivo para continuar a defender esses valores, mesmo que isso suscite o sarcasmo das brilhantes inteligências congregadas em torno de Isabel Días Ayuso.”

É isso mesmo. Estamos em tempo de clarificação, quem está com os valores fundamentais ou quem deles escarnece. Chamem-lhe o que quiserem, esquerda mínima, ou o que raio inventarem, mas definam-se uma vez por todas.

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