(Vicente Todoli fotografado por Raul Belinchon - EFS)
(Um artigo/entrevista no El País Semanal (link aqui), essa revista agora difícil de encontrar em papel, sendo necessário ir a Tui para a encontrar assim como ao jornal, transporta-nos para o paradeiro atual de uma personalidade, indiscutivelmente ligada à internacionalização cultural do Porto. É de Vicente Todoli que falo, agora às voltas com a sua Fundação na Comunidade Valenciana e entregue ao sortilégio da cultura renascentista dos citrinos, num hino ao Mediterrâneo.)
Tenho de memória que escrevi várias vezes sobre o significado da passagem de Vicente Todoli por Serralves o que ela significou para o Porto culto e cosmopolita). E recordo-me que um dos traços mais marcantes dessa recordação é que muito boa gente no Porto só compreendeu quem teve consigo quando Todoli zarpou diretamente para dirigir a Tate Modern em Londres. Aí sim, muita gente ficou convencida que os avanços de Serralves tinham chegado mais longe. Tudo o que escrevi (e que agora recordo sobre a matéria) não belisca em nada o trabalho realizado pelos sucessores de Todoli em Serralves, incluindo João Fernandes que por acaso vi no outro dia a passear num sábado à tarde no Parque de S. Roque na parte oriental da Cidade. A minha referência a Todoli prende-se apenas com o facto dele ter representado a viragem, alinhando por um movimento imparável de internacionalização dos grandes equipamentos culturais. E com esta viragem abre-se uma outra questão, essa de maior profundidade, que consiste em saber até que ponto a entrada pelas vias da internacionalização com as limitações de recursos públicos para a cultura é ou não compatível com o papel que as instituições como Serralves devem representar em relação ao seu entorno, disseminando e não secando a dinâmica cultual endógena. Creio que nessa questão tem havido evoluções nos últimos tempos que mostram que a internacionalização globalizada pode não gerar necessariamente a “entronização” do equipamento e que Serralves poderá ser um catalisador e não algo que seque dinâmicas à sua volta.
Mas não é para discutir essa questão que o post de hoje é redigido.
O artigo/entrevista do El País, onde a passagem por Serralves passa quase despercebida (ia falar de “chauvinismo espanholado” de trazer por casa, mas pode ser circunstancial), coloca-nos perante o seu paradeiro atual.
Todoli é entrevistado na sua quinta de Palmera, povoação em que nasceu na Comunidad Valenciana, dedicado a um equilíbrio renascentista entre arte e botânica e ocupado numa cultura de mais de 400 variedades de citrinos, algumas das quais recuperadas do desaparecimento físico, induzido pelas famigeradas culturas intensivas. Deliciem-se com esta invocação digna de Proust: “Os citrinos são a minha infância, a minha madalena de Proust; foi aqui que os meus primeiros sentidos despertaram, onde comecei a apreciar o que era o mundo. Aos três anos deixavam-te à solta na rua e divagavas pelos campos. Todos os lados se convertiam em lugares de fantasia e sonho, sentias-te fora do tempo, em liberdade”.
A quinta em que Todoli ocupa agora o seu tempo aos 63 anos compõe-se de horto botânico, laboratório gastronómico, biblioteca e um ainda muito incipiente museu etnobotânico, sendo na prática financiada pela sua atividade de direção artística em coisas tão diversas como a Fundação Pirelli HangarBicocca em Milão, assessor principal para as Artes Plásticas da Fundação Botín, assessor do Centro de Arte Bombas Gens em Valência e da coleção Inelcom em Madrid.
Ora aqui está um desígnio a ser explorado, o mundo entre a arte e a botânica, o charme não anda apenas pela economia do vinho, há aqui um potencial enorme para os nossos candidatos a renascentistas do nosso tempo.
Nota: o artigo do El País é assinado por Alfonso Pérez-Ventana.
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