sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

NO OUTRO MUNDO DA HIGHER EDUCATION

 


(Já perceberam que tenho um fraquinho pela Gillian Tett, cronista do Financial Times, até agora radicada nos EUA, responsável pela unidade americana do jornal e autora de uma das obras mais entusiasmantes que li nos últimos tempos, o Anthro-Vision, na qual a jornalista se dedica a estender a sua área disciplinar da antropologia ao mundo dos negócios. Acompanhando regularmente a sua muito moderada presença no Twitter e obviamente as suas crónicas no FT, não posso deixar de registar o seu regresso ao Reino Unido, para assumir o lugar de PROVOST no King’s College da prestigiada Universidade de Cambridge e a sua função de cronista no jornal. Não é uma notícia vulgar. Ela projeta-nos no mundo sofisticado e cosmopolita da educação superior e avançada e era sobre isso que gostaria de produzir alguma reflexão.)

 

O modelo de organização da educação superior e avançada no mundo anglo-saxónico tem que se lhe diga e o caso do Reino Unido constitui um caso muito particular nesse outro mundo de singularidade. A singularidade do caso britânico tem de ser entendida num quadro de profunda desigualdade no interior do sistema, determinada por uma longa permanência dos conservadores no poder (espero que não por muito mais tempo e a vitória de ontem dos Trabalhistas no West Lancashire por uma larga diferença dá esperança que assim seja, link aqui). Mas o topo do sistema combina ainda relíquias do passado com a sofisticação cosmopolita e globalizada, o que lhe concede uma combinação única, da qual tenho tido alguns ecos através de colegas universitários que por lá passaram, pelo menos em estadias de alguns dias. Relembro agora um fabuloso livro do precocemente desaparecido Javier Marías sobre o ambiente de Oxford, Todas as Almas (Alfaguara), inspirado pela sua passagem como leitor por essa Universidade, que recomendo vivamente aos que, como eu, não tiveram a oportunidade de passar um dia que fosse num College.

O Twitter de Tett tinha a particularidade de trazer consigo a referência a um posto, o de PROVOST, sobre o qual tive obviamente de fazer alguma pesquisa sumária, já que precisava de saber se era alguma especificidade dos Colleges ou se, pelo contrário, poderia ser considerado algo extensivo ao mundo das universidades anglo-saxónicas. Pelo que pude perceber, o PROVOST é administrador académico de nível elevado, que dependendo da universidade, tanto pode assumir o papel de Diretor Académico responsável pela supervisão daas atividades curriculares, educativas e de investigação como ser também uma espécie de Diretor Executivo de uma universidade ou college. O que significa que em alguns casos predomina um modelo dual, em que Presidente, Chancellor ou Reitor atuam em conjunto com o PROVOST.

Pelo que entendi da comunicação da própria Gillian Tett, da Universidade de Cambridge e do King’s College (link aqui), penso que o cargo é uma espécie de Diretor Executivo do King’s e para isso terá contado sobretudo a inserção internacional da jornalista, a sua sensibilidade às questões da igualdade nos tempos de hoje e sobretudo ao facto de Tett ser uma personalidade com notoriedade de largo especto que lhe é proporcionada pela sua ligação ao universo do Financial Times.

E é sobretudo este último aspeto que me interessa destacar nesta referência a este mundo particular da formação superior e avançada de âmbito e projeção mais globalizados.

Comparando com as limitações cá do burgo, a figura mais próxima do PROVOST seria a do Administrador, cuja competência cá por estas paragens é sobretudo determinada e avaliada pela sua capacidade de compreensão e manuseamento da teia insondável dos mecanismos burocráticos e administrativos, a começar pela legislação complicada que rege as universidades, as regras orçamentais ainda mais opacas e as modalidades de financiamento.

Sim, é verdade que por muito que nos esforcemos Portugal dificilmente pode ter uma universidade de Cambridge ou algo que se parecesse com um King’s College. E o melhor termo dessa comparação, talvez obtusa e algo injusta para as nossas limitações, a melhor ilustração disso é comparamos a figura de Gillian Tett à frente do King’s a partir de outubro de 2023 com a de um qualquer competente Administrador de uma das nossas Universidades.

É a vida.

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