quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

BARNIEREXIT

Sessenta e dois anos depois da queda de George Pompidou, eis que voltou a ocorrer uma queda de governo da Vª República Francesa na Assembleia Nacional. Por uma margem razoavelmente confortável (43 votos acima dos 288 requeridos), conseguida à custa de uma adesão da extrema-direita à moção de censura do bloco unido de esquerda, Michel Barnier caiu com algum estrondo a um dia de completar três meses no poder.


(Patrick Chappatte, https://www.lemonde.fr)

 

Teremos certamente de convir que a missão que aceitou desempenhar a convite de Emmanuel Macron era de natureza quase impossível, tornando ainda mais patente a crescente ingovernabilidade da França – ademais após a estranha dissolução da Assembleia pelo Presidente da República em junho passado – e o caráter envenenado do presente que aceitou receber. Ou seja, e por um lado, Barnier foi vítima da sua vaidade em fim de carreira, tendo-se deixado autoconvencer quanto aos seus dotes de convencimento em relação a Marine Le Pen; mas, e por outro lado, Barnier também procurou ser útil a um país em estado de coma financeiro ao apresentar com firmeza um orçamento austeritário para atacar um défice público brutal (o serviço da dívida ascende a mais de 600 mil milhões de euros, um legado que só pode ser assacado a Macron e seus anteriores ministros responsáveis).

 

Cumpridas hoje as obrigatórias formalidades de demissão, Barnier sairá de cena e a palavra passará de novo para um Macron que já não sabe para onde se voltar perante uma situação catastrófica e uma imagem altamente degradada aos olhos da maioria dos seus concidadãos. Bem faria ele em criar condições para uma alternativa de regime – o destino da Vª República parece traçado, apenas não se sabe quando lhe será dado o golpe final... – mas, não sendo esse o caso mais provável, tudo se vai reduzir a uma de três escolhas primoministeriáveis (por ordem decrescente de probabilidade): um tecnocrata com imagem clara de direita (por forma a ser aceite por Le Pen, embora sempre sujeito a ter o cutelo em cima), uma figura do “Rassemblement National” (entregando à extrema-direita a direção político-económica dos próximos anos e esperando que um falhanço o alcandore a um lugar de reabilitação democrática) ou uma personalidade de esquerda (de preferência moderada e capaz de lograr montar um governo sem a “France Insoumise” de Mélenchon). Veremos mais logo o que vai dizer aos franceses o presidente – um homem que confrontou o regime estabelecido, ajudou a destruir os partidos convencionais e acabou por falhar em toda a linha no momento de levar a cabo as suas ideias revolucionárias e o seu projeto alegadamente reformista.


(Ulises Culebro, https://www.elmundo.es)

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