O primeiro-ministro resolveu recuperar o discurso do “oásis”, tristemente inaugurado pelo ministro das Finanças Jorge Braga de Macedo em 1992, apenas modificando marginalmente a designação do país para “farol” – “um farol de estabilidade política, social e financeira”, nada menos! A incursão de Montenegro teve por base motivacional um aproveitamento em benefício próprio de uma apresentação oficial de Mário Centeno, enquanto governador do Banco de Portugal (BdP), segundo a qual a trajetória orçamental portuguesa poderá distinguir-se daquela que é avançada pelo Governo e por algumas instituições internacionais (ver gráficos abaixo); tecnicamente, esta projeção do BdP tem o seu fundamento, sendo por demais conhecidas e inquestionáveis as várias decisões governativas tomadas este ano com impacto notório em termos de despesa duradoura (como, aliás, também o Conselho de Finanças Públicas já procurou sinalizar).
Dito isto, o problema tem outra dimensão e essa é política. Porque Centeno enfiou na cabeça a ideia de que poderá ser presidente da República e, para tal, entende que é conveniente aborrecer o Governo (que não o reconduzirá em meados de 2025) e agradar a Pedro Nuno. Daí que se tenha esmerado em prever que 2025 não prolongará os excedentes recentes mas que o que ocorrerá será um défice de 0,1% do PIB – ou seja, utilizar o palco da entidade reguladora para vir adiantar um número mais do que falível e apenas marcado pelo sinal negativo que ostenta constitui uma suprema provocação por parte de um Centeno que assim escolhe objetivamente fazer política a partir do lugar supostamente independente que ainda ocupa. Depois deste momento de alguma infelicidade, desenrolou-se o habitual folclore de ditos e contraditos, da primeira reação de Montenegro salientando que o governador está sozinho à de Pedro Nuno salientando que o alerta do governador é para levar a sério e à de um Marcelo inspiradíssimo a atirar também a um Centeno que caraterizou como um ministro das Finanças que era “muito agarrado”. E a culminar tudo isto, após as sempre objetivas pronúncias de Marques Mendes e Paulo Portas, eis o chefe de Governo a vir arrebatadamente, do alto do seu inebriamento com uma função que nunca pensou exercer, lançar o País na senda de uma luminosidade exemplar e orientadora que faz a inveja dos nossos parceiros europeus. Verdadeiramente incorrigível, e insuportável, a nossa cena política!
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