(Dois
dias de trabalho, nos Açores, ilha Terceira, oportunidade para um reencontro com a Autonomia e captar o que vai mudando
neste território, que deveria merecer uma melhor atenção dos Portugueses em
geral dado o que significa viver num arquipélago longínquo)
Há muitos anos atrás a Terceira e Angra do Heroísmo foram
a minha porta de entrada de conhecimento dos Açores. Na sequência das
oportunidades de trabalho na região, a porta de entrada foi mudando para São
Miguel e Ponta Delgada, com algumas passagens mais esporádicas pelo Faial e
Horta.
Foi, por isso, com alguma curiosidade que regressei à
porta de entrada da Terceira e de Angra do Heroísmo, gozando a calma do
Terceira Mar, que tem aquela particularidade de acordarmos de manhã com o Monte
Brasil no horizonte imediato e o mar a bordejar a sua base. Claro que aquele
relvado que precede e enriquece a piscina exterior do hotel terá de ficar para
uma outra estadia, pois apesar do dia de quinta feira ter sido um dia de
agradável amenidade, contrastando com as notícias que vinham do continente, a
ambiência convidava mais a uma bebida no bar do que aventuras pela imensidão
daquele relvado.
A Terceira sempre foi para mim uma entidade misteriosa.
Das conversas lá bem para trás com o já desaparecido e saudoso Carlos Corvelo,
com jantares de franca cavaqueira no Fernando em S. Mateus, transmitia-se
aquela ideia da riqueza de tertúlia e pensamento, mas ficava sempre
desconcertado pois só em algumas livrarias de Ponta Delgada encontrava sinais
dessa tradição pois livrarias em Angra nunca cheguei a dar com elas. Mas o ar
claramente menos cosmopolita de Angra quando confrontada com Ponta Delgada e mesmo
a Horta era precisamente a nota que lhe dava para mim algum encanto, que alguma
sombra de patine reforçava, realçando o tom inequivocamente mais recolhido (que
alguns dirão fechado e aristocrata) com que Angra se diferencia.
Estava por isso curioso em apreender de que modo a
descoberta do turismo pela região terá alterado esse padrão, sabendo de antemão
que janeiro não é o mês certo para entender essa mudança e estou certo que nos
próximos tempos terei oportunidade de recolher evidência para a minha pesquisa
de visitante quase acidental. Mas há sinais de uma mudança lenta em Angra do
Heroísmo, lenta muito lenta, de que a proliferação de alguns restaurantes é
talvez o sinal mais evidente (a Tasca das Tias recomenda-se). O comércio local
(que foi sempre um fator desfavorável relativamente a Ponta Delgada) vai dando
sinais de alguma transição e antevejo por isso que a dualidade vai manter-se
por algum tempo.
A base das Lajes lá está no meio do oceano imponente e já
claramente rendida ao abandono daquela massa de americanos (que chegou a 5.000
empregos). Por estranha coincidência, ontem, os jornais de Angra davam conta de
que algumas residências de pessoal americano, encerradas desde 2015, mas
presume-se ainda equipadas, tinham sido assaltadas por meliantes detidos entretanto.
Não tive tempo de regressar à ambiência da Praia da Vitória comparando-a com a
minha imagem do passado, construída ainda com americanos à mistura, para
apreender de que modo se consumou a transição para o novo contexto. Alguns
caças americanos, expectantes na pista, talvez estivessem associados ao
aquecimento das coisas no Golfo, mas podia ser algo de circunstancial. Um grupo
de militares espanhóis de uma força ORION da NATO passaram pelo Terceira Mar mas
imagino mais em missão de treino do que por qualquer outro motivo.
Desconheço quais os planos e ideias do Governo Regional para
as Lajes neste outro contexto de cooperação com os EUA. A infraestrutura tem
uma dimensão que transcende bastante todo o potencial de transporte aéreo
normal da Terceira e de ligações inter-ilhas, mesmo admitindo que o surto
turístico possa vir a intensificar-se. Por isso, há ali um potencial de capital
físico para o qual alguma ocupação ou função terá de ser encontrada.
Estou com curiosidade em avaliar o que pode o Parque de
Ciência e Tecnologia da Terceira TERINOV pode vir a representar, mas isso fica
para reflexões futuras, com mais estadias na base do Monte Brasil e desejavelmente
com usufruto daquele magnífico relvado em simbiose com o mar.
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