(Imagens do debate da investidura com a deputada do EH Bildu a abandonar o palco depois da sua intervenção)
(Penosa é a única palavra que me ocorre para classificar
a caminhada de Pedro Sánchez para a sua eventual investidura na próxima
terça-feira. E, ao contrário do que poderia pensar-se, a margem de
vitória na segunda volta da votação no Congresso de Deputados reduziu-se
substancialmente para cerca de um deputado, sobretudo depois da tomada de
posição da Coligação Canária em que uma deputada quebrou a disciplina de voto e
anuncia votar contra a investidura.)
A Espanha vive momentos conturbados e isso não me agrada
para além de poder revelar-se catastrófica para os nossos próprios interesses
de país simultaneamente ibérico e europeu, mas cuja força de integração
europeia seria fortemente lesada pela instabilidade permanente dos nossos
vizinhos. Sou o primeiro a considerar que o esforço de Pedro Sánchez para
retirar o problema catalão da via judicial em que o PP de Rajoy o colocou é
meritório, constituindo aliás a única via possível para diluir a tensão que
está criada. Pode dizer-se que essa diluição de tensão é meramente provisória,
é tudo uma questão de tempo, pois o problema está lá e a dimensão do
independentismo não dá sinais de esmorecimento, antes pelo contrário, e tem
aliás a demografia a seu favor, pois a juventude catalã foi bem trabalhada,
sabe-se lá em que condições. O acordo conseguido com a Esquerra Republicana,
tirando partido da relativa rotura que existe entre a ER e as restantes forças
independentistas ligadas a Carles Puigdemont, é um prodigioso equilíbrio da contenção
possível. Tanto mais prodigioso quanto em plena negociação mais uma decisão
judicial (indiscutível nesse plano) respeitante à destituição de Quim Torra da
presidência da Generalitat por desobediência administrativa) vem aquecer de
novo o ambiente.
Já quando Sánchez acena como argumentação os meandros de
uma Espanha Federal emergem dúvidas mais sérias, pois continuo a admitir que
uma Espanha das nações e das autonomias pode não equivaler necessariamente a
uma Espanha Federal. Mas no contexto de uma negociação tão complexa (e tudo
isto é apenas para assegurar uma investidura, imaginemos o que será o cenário
de uma governação quotidiana nestas condições) invocar ou não o federalismo é
coisa secundária, não me custa admiti-lo.
Mas assistir ao desenvolvimento da sessão parlamentar que
conduziu à esperada evidência de que não existia em primeira volta espaço para
uma maioria absoluta traz a sensação de uma penosidade em torno da qual pode
questionar-se se o preço desta investidura não será demasiado alto para ser
suportado.
De
facto, mesmo sem conhecer os termos não publicamente divulgados dos acordos
conseguidos para a abstenção de algumas forças nacionalistas, a contínua
animosidade de algumas dessas forças, não apenas dirigida à esfrangalhada
direita espanhola, mas também ao próprio PSOE enerva qualquer um e a única
coisa que me ocorre dizer é que não me agrada aquele sorriso cínico amarelo de
Pedro Sánchez. Assistir na dinâmica da investidura a posições como a do EH
Bildu, agremiação diretamente emanada da ETA de má memória, mina qualquer
acordo por mais prodigioso que seja, projetando-se naturalmente numa Espanha
totalmente fraturada e anunciando uma legislatura de uma complexidade extrema.
Pelas
bandas da esfrangalhada direita espanhola, as coisas não vão melhores. Tal qual
Joana d’Arc revigorada, com uma presença cénica notável, Inés Arrimadas do
Ciudadanos tenta em vão apelar aos barões do PSOE para uma última prova de
desobediência para inviabilizar a investidura, tentando recuperar a ideia da aliança
PSOE-PP- CIUDADANOS que o seu ex-líder e próximo Rivera desbaratou e
comprometeu. Em vão.
Amanhã,
se nenhum trânsfuga de última hora não aparecer, Sánchez lá conquistará a
investidura talvez por um único voto de diferença e aposto que não haverá um
espanhol por mais distraído e desinformado que seja que vá desconhecer o nome
Teruel. É que se o deputado que representa o movimento em torno daquele símbolo
da periferia (aragonesa) espanhola negar o apoio a Sánchez haverá um empate e
tudo recomeçará de novo.
Mas
a caminhada para a investidura talvez seja apenas um calvário que irá
desembocar no inferno da governação, a não ser que a antecipação do regresso da
direita ao poder provoque um súbito e inesperado movimento de
responsabilização.
Para
acompanhar com todas as ferramentas possíveis.
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