sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

PODE O CATALANISMO NÃO INDEPENDENTISTA REERGUER-SE?

(Parlament)

(Nas minhas análises do problema catalão sempre dei atenção ao potencial de concertação que a expressão cultural e socioeconómica do Catalanismo não independentista representa. O seu desaparecimento de cena e perda quase total de intervenção política complicou o já de si complexo problema. Poderá reerguer-se?)

A história da Catalunha e dos seus intermitentes sobressaltos seja com o reino de Castela (já desde os tempos de Isabel, a Católica), seja com a Espanha franquista, seja ainda com Madrid e outras regiões da Espanha democrática (não esquecendo o período da República posteriormente arrasada pelas forças falangistas) é, como tenho sublinhado neste blogue, uma matéria movediça, com uma evidente conflitualidade interpretativa. Sei também que o ganho de forças do independentismo catalão acabou também por ter alguma tradução numa espécie de revisionismo da história da Catalunha, com interpretações de eventos que estão longe de estar totalmente validados pela comunidade científica.

Não ignorando esse material que, como seria de esperar, não é do apreço do independentismo catalão que busca todo o tipo de narrativas para justificar o passo mais largo do que as pernas que acabou por dar, a existência de uma realidade cultural e socioeconómica a que chamaremos catalanismo é irrecusável. Nesse reconhecimento, teremos de ter em conta o revisionismo de sinal oposto que ao abrigo de um “espanholismo” muitas vezes serôdio e passadista se recusa ele também a aceitar a individualidade cultural catalã.

O problema é que, por razões diversas, o catalanismo não independentista viu afundar-se o seu protagonismo político, particularmente depois da queda do “pujolismo” que as evidências mostraram ser bem menos bondoso e honesto do que esperámos. Dizem alguns “mentideros” da vida catalão que, quando a Convergencia i Union se constituiu e no meio da burguesia catalã emergiu Jordi Pujol como a personalidade que haveria de conduzir o processo político dessa perspetiva, terá havido um pacto secreto entre os que continuariam a dedicar-se aos negócios e os que assumiam o compromisso político da liderança do catalanismo e da Generalitat. Esse pacto não teria sido inocente e a família Pujol estaria “autorizada” a compensar sabe-se lá por que meios a sua ausência forçada dos negócios. Esta narrativa é em parte confirmada pela sequência de atos de corrupção em que diferentes membros da família Pujol se viram mergulhados. Com a desagregação política da CiU e a desgraçada chegada ao poder regional de Artur Más, onde todas as derivas independentistas começaram, abriu-se um largo vazio político que o radicalismo independentista ocupou, preenchendo o vazio. Não sei se exatamente apenas por esse motivo, essa desagregação da CiU coincidiu com a saída de cena do catalanismo. O Partido Socialista Catalão (PSC) rapidamente deu mostras que não tinha unhas para tal empreendimento e o início promissor do CIUDADANOS rapidamente resvalou também para que o catalanismo fosse pelo cano abaixo.

Porquê então regressar ao tema, a uma espécie de quixotismo catalão, embora perceba que Cervantes não seja lá muito querido nestas paragens?

Tudo isto porque fui hoje alertado por uma notícia do El Mundo (link aqui) que faz referência a um movimento de intelectuais catalães decididos a protagonizar uma tentativa de superação do conflito aberto entre a Catalunha e a restante Espanha, regressando ao protagonismo do catalanismo não independentista. O grupo integra intelectuais, empresários, professores, executivos, economistas e juristas, apontando a uma formação que tem de assumir alguma expressão eleitoral em torno do que poderíamos designar “centralidade catalanista”.

Tudo dependerá da dimensão da ferida fraturante que se instalou. O catalanismo não independentista sempre existiu e tem experimentado nos últimos tempos uma sensação de não representação. No manifesto afirma-se que “a Catalunha tem de estar presente na construção da política espanhola com um peso específico grande, por vezes determinante, em lin.ha com a sua realidade histórica, o seu potencial económico, o seu tecido cultural e a sua vontade de ser”. Bonitas palavras. Mas será necessário que o eleitorado reconheça que essa é a via de representação do catalanismo independentista, forçando o radicalismo catalão a novas tréguas, sabe-se lá até quando.

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