(Talvez não tenha havido “silly season” e compreende-se a razão. Mas a maneira leviana como a Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social tratou o (pouco escrutinado e não percebo as razões) relatório da Ordem dos Médicos sobre o lar de Reguengos de Monsaraz revela mau gosto ou ilusão de que em férias tudo é perdoado. Mas não é e se o oposição for inteligente (esperança vã) creio que gente do governo vai ter de antecipar regresso de férias.
Ana Mendes Godinho foi para mim a grande surpresa de composição do atual governo. Substituir uma personalidade política com a espessura de Vieira da Silva não é pera doce, mesmo que uma certa imprensa não se canse de colar o ex-ministro às derivas de José Sócrates. Mas o trajeto de Vieira da Silva é notável e por isso esperaria que a sua sucessão fosse acautelada e longe de todos nós estava na altura a hipótese de que os tempos de pandemia haveriam de destruir a significativa recuperação vivida pelo mercado de trabalho.
As escolhas ministeriais têm a sua lógica e padrões de racionalidade que não são necessariamente de conhecimento público, pelo que cabe ao primeiro-Ministro interpretar os CV e experiência de quem está na berlinda. Ponto final. Mas neste caso custou-me a engolir que uma personagem vinda do turismo, um setor em que a precarização das relações de trabalho atinge níveis muito elevados, representasse a sucessão mais adequada para Vieira da Silva.
À medida que todos começámos a contactar com a governação em movimento julguei intuir as características que terão determinado a escolha. AMG dava mostras de ser operacional, ter capacidade de decisão e obviamente de desenvoltura tecida no universo do turismo. Mas dei para mim a pensar que oxalá os ventos fossem favoráveis, pois não me parecia uma ministra suficientemente robusta para outros tipos de navegação e não faço a mínima ideia de quem a rodeia em termos técnicos e políticos.
O caso do Lar de Reguengos é uma prova de fogo para qualquer político. Ou o relatório da Ordem dos Médicos é tendencioso ou pouco rigoroso (e nesse caso o escrutínio público desse relatório deveria ter sido imediatamente promovido, ouvindo responsáveis visados) ou, caso se tratasse de um documento inatacável, então a resposta política às suas conclusões era obrigatória. Por detrás do surto de Reguengos de Monsaraz poderão estar falhas de Estado que comprometem mínimos aceitáveis de estado de bem-estar. E estou-me nas tintas para a importância política do Presidente da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz no Alentejo tendo em conta a desesperada tentativa do PS em reduzir a influência política do PCP nessa região.
A maneira leviana e “ligeirinha” com a que a ministra despachou a não leitura do relatório entra nos manuais dos erros de atuação política, revelando seja insensibilidade, seja desplante, seja coisas piores que abdico de identificar. Tudo isto ao serviço de um partido que se orgulha da atenção à coesão social e para mais numa área em que o PCP se movimenta no Alentejo como peixe na água.
Não pude deixar de me fixar num traço revelado por esta inépcia política: ligeireza que “ligeirinhos” e “ligeirinhas” respiram. E tantos “ligeirinhos” e “ligeirinhas” se passeiam por aí.
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