(Não tenho qualquer pretensão de compreender o funcionamento interno do PS e o modo como dele emergem os personagens para a vida pública seja de deputados da Nação, seja de membros do Governo. É competência que exige vivência interna e não será da minha escrita que emergirão análises transmitidas por outros sobre a matéria. Neste contexto de limitação, devo confessar que a força política de alguém como Eduardo Cabrita sempre foi para mim um mistério. Mas nos tempos mais recentes, não é apenas de mistério que se trata. É de rastilho que me apetece falar...)
Já se compreendeu que Eduardo Cabrita conta para António Costa. Há vários indicadores que apontam nesse sentido. E não estou a referir-me ao que alguns jornalistas associam aos tempos da Faculdade de Direito de Lisboa e aos laços políticos que nesse tempo terão sido criados entre ambos. Estou antes a invocar um conjunto de factos que considero relevantes. Quando Constança Urbano de Sousa desabou com a crise dos incêndios foi Eduardo Cabrita que Costa foi buscar para ocupar na altura o crítico lugar de Ministro da Administração Interna num momento claramente difícil para o primeiro-Ministro. Atribui-se ainda a Eduardo Cabrita a origem das decisões de consagrar a eleição indireta dos Presidentes das CCDR por via de um colégio eleitoral de autarcas, que António Costa assumiu, resistindo teimosamente às críticas que tal medida suscitou. É ainda Eduardo Cabrita que esteve na origem da outra ideia gerada no PS das eleições diretas dos Presidentes das Áreas Metropolitanas que só não avançou porque a medida tinha um potencial de conflito constitucional com Marcelo, que em meu entender tinha razão na matéria. E, se alguma dúvida ainda subsistisse, o modo rápido como António Costa respaldou a atuação do seu Ministro da Administração Interna no caso do assassinato pelo SEF do imigrante ucraniano mostrou a todos que Cabrita conta para o primeiro-Ministro. Não estou a dizer com isto que Cabrita escape necessariamente a uma demissão, o que pode ou não acontecer, embora ela correspondesse a alguma reminiscência saudável de outros tempos em matéria de responsabilidade política. O que estou a afirmar é que a combinação de todos estes factos demonstra que Eduardo Cabrita tem força política e conta para António Costa.
O que é um mistério para mim, mas devo dizer que com esses mistérios poderia o Governo bem. O problema é que, na sequência da aceleração comunicacional dos acontecimentos em torno da morte do imigrante Ucraniano, o mistério se transformou em rastilho desgovernado. Senão vejamos. O Presidente da República foi apanhado no processo. Vinda não sabemos de onde apareceu uma putativa reforma do SEF, que tanto pode ser uma supressão como uma perda de funções, o que é a pior maneira de se reestruturar um serviço tão determinante nos tempos que correm e por cima antes da Presidência portuguesa da União. E quem dirige a Polícia de Segurança Pública decidiu fazer de Ministro após audiência com Marcelo, propondo a fusão do SEF com a PSP para formar uma Polícia Nacional, isto depois de ter defendido os “bons” profissionais polícias do SEF. Logo apareceu o presidente do sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SCIF) que veio a terreiro a opor-se a tal fusão e a afirmar que afinal o SEF não tinha um problema sistémico, tão só um problema de recursos e, palavras minhas, que tudo seria imaginação do Diretor Magina da Silva, que se terá imaginado, segundo o Ministro Rastilho Cabrita a definir o que não lhe compete, política.
De mistério a rastilho e lá está todo o caldo entornado, o que é tudo o que não desejaríamos após a humilhação porque está a passar o Estado português numa matéria de extrema sensibilidade nas sociedades atuais, as migrações e o respeito dos direitos humanos relativamente aos que se encontram privados de dignidade. Quando se governa em função dos comentadores e da valsa comunicacional é o que dá. Até que pode acontecer que António Costa leve até ao fim a sua teimosia e que Eduardo Cabrita para tentar dar sequência à sua conferência de imprensa patética resista à humilhação, evoluindo no sentido do programa do PS, separando funções policiais e administrativas do SEF. O problema é que tudo ficará mais precário, ia escrever podre, e talvez fosse a palavra certa.
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