Já vimos em posts precedentes que a situação é de impasse e completa incerteza. Senão vejamos:
(i) o Partido Socialista e António Costa amarrados a uma esperança quase obsessiva de maioria absoluta que tanto pode acontecer como, mais provavelmente, não suceder (o que os deixará próximos do “trauma de Lisboa”, na sequência da derrota de Medina que nunca conseguiram sequer admitir como possível), tornando patente quanto aquela organização careceria de uma verdadeira ação de alto a baixo de formação de quadros políticos (como pode, de facto, um “rato” como António Costa rever-se minimamente em Carlos César, Ana Catarina Mendes ou José Luís Carneiro, para só falar dos institucionalmente mais próximos?) e quanto depende quase exclusivamente de Costa (cuja narrativa é, agora, a não prometer nem vacas voadoras ― lembram-se? ― nem varinhas mágicas mas tão-só a de vender persistência (transformadora, subentenda-se) e do astuto cinismo de Augusto Santos Silva (“o PS assumirá todas as responsabilidades que lhe derem”, não sem ajuntar que o PS não fará governos com o PSD e que os próximos orçamentos devem ser à esquerda);
(ii) o PSD está a aquecer os motores para o próximo fim de semana, quando finalmente escolherá entre uma liderança de Rio ou de Rangel, sendo que estes se atiram a tudo quanto os possa ajudar na disputa, mesmo de modo desfasado e até capaz de estragar a essência argumentaria, (com Rio a afinar a sua line to take, como na contraposição da necessidade de uma aumento da salário médio a uma aumento do Salário Mínimo Nacional ou em várias incursões da entrevista ao “Público” de hoje, e Rangel a evidenciar as suas hesitações sobre qual a melhor forma de chegar whatever ao trono obsessivamente ambicionado e cuja viabilidade vai sendo objeto de sinais contraditórios ― Balsemão e Morais Sarmento (“são os dois fantásticos”) a “cortarem-se” de tomar posição mostram dúvida, os figurões à volta de Rangel mostram algum esforço de notoriedade extrapartidária, o anúncio de Rio sobre listas de deputados antes da posse no novo líder mostra algum domínio do aparelho que pode vir a fazer a diferença);
(iii) os partidos da antiga “geringonça” (2015-19 ou 2015-21?) perderam os poderes, já de si escassos, que pareciam ostentar, ambos divididos entre ortodoxias de diversa natureza (mais pesadas as do PCP, que levarão João Ferreira ao próximo secretariado-geral se o enterro não for feito antecipadamente pelo abatido Jerónimo, menos pesadas, que não menos expressivas, as do Bloco, onde Louçã e Mariana Mortágua (com Catarina em manifesto fim de festa) encostaram conjunturalmente outras expressões táticas possíveis e quiçá mais inteligentes ou melhor remuneradoras);
(iv) à direita, o CDS só terá salvação se Rio ou Rangel lhe derem a mão, coisa a que a postura infantilizante de Chicão não ajuda (ele não sabe mesmo o que quer e como quer, não fora o seu instinto de sobrevivência quanto à dita mão salvadora e o modo como enfrentou e humilhou a arrogância preguiçosa de Nuno Melo), o “Iniciativa Liberal” espera pela sua hora (talvez aproveitando para densificar o liberalismo pouco estruturado das suas propostas) e o “Chega” entretém-se a lançar a confusão (com o caso dos Açores a servir para que possam ir fazendo prova de alguma vida num contexto de “desconhecido” que os não favorece);
(v) o PAN deixou-se mergulhar numa escandaleira pública pouco edificante, logo depois de ter dito que tanto seria capaz de viabilizar um governo do PS ou do PSD ― lembram-se do ministro Borrego? ―, enquanto o “Livre” permanece relativamente aturdido (a derrota de Medina também se somou para fazer deles um partido algo amaldiçoado do nosso sistema).
Entretanto, e como já explicitei em posts anteriores, os nossos comentadores rejubilam com a situação e deixam fluir a sua melhor expressão de que “a asneira é livre”. Mesmo autores dignos de uma boa apreciação já não disfarçam a sua perturbação do momento, num misto de irritação generalizada e vontade localizada, com Rangel a surgir como o maior beneficiário desta lógica (João Vieira Pereira, João Miguel Tavares, David Dinis e Paulo Baldaia são bons exemplos, mas a má catadura de Clara Ferreira Alves acaba por ser objetivamente uma aliada no mesmo sentido) e outros a “geringonçar” direta ou indiretamente como se não houvesse amanhã (Daniel Oliveira, Pedro Adão e Silva e Francisco Louçã são bons exemplos). Para não falar de Marques Mendes, que já não sabe mais o que dizer contra Rio (indo ao ponto nada alaranjado de falar da “maioria absoluta” como a solução que tem mais vantagens), e da opção por uma governação de esquerda moderada (Miguel Sousa Tavares, desde há semanas, e Basílio Horta, em entrevista de hoje).
Aqui chegados, diria o óbvio: o primeiro grande momento de clarificação virá do PSD no próximo Sábado 27. Há que esperar por esta escolha, após o que se começará a desvendar como se reajustam as forças e, especialmente, o PS. Por ordem decrescente de probabilidades a cheiro pessoal, assim apontaria o que aí vem:
(i) um governo de “maioria presidencial” (usando a expressão de Júdice);
(ii) um governo de maioria absoluta do PSD com alinhamentos múltiplos à direita (e com Rangel à cabeça);
(iii) um governo de “geringonça” renovada (com PAN e “Livre” e talvez sem o apoio dos comunistas);
(iv) um governo de maioria absoluta do PS;
(v) um governo de iniciativa presidencial, melhor ou pior disfarçado de governo de Bloco Central puro e duro e em que Marcelo viesse finalmente revelar a sua verdadeira condição de “dono disto tudo”.
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