A crise de 2007-2008
teve o seu epicentro, como sabemos, no sistema financeiro e daí irradiou para uma
das mais significativas destruições de valor e de produção de que há memória,
agravada pelo peso excessivo das políticas de contenção orçamental em economias
que deveriam fazer o contrário a bem da economia mundial.
Em posts anteriores, temos
destacado a extrema dificuldade da globalização económica recuperar os níveis
atingidos antes da crise financeira. O comportamento das cadeias de valor globais
pode estar a alterar-se, não é ainda certo que estejam a ser encurtadas e o
volume de produtos intermédios comercializados a nível mundial pode voltar aos
ritmos anteriores, é ainda uma indeterminação. Essa indeterminação não estava ainda
clarificada e já o advento do protecionismo e do nacionalismo económico vieram
agravar essa mesma indeterminação.
Como a globalização
financeira esteve na origem de toda a precipitação consequente foi-lhe dada
menos atenção. E a pergunta inevitável é se também do ponto de vista dos fluxos
financeiros a nível mundial estarão a formar-se tendências para o recuo da globalização.
Se assim for, tendo em conta que a globalização das pessoas (fluxos migratórios
a nível mundial) experimenta hoje uma forte pressão persecutória e securitária,
que o terrorismo tem substancialmente ampliado, teríamos um recuo da globalização
nas sujas três dimensões: económica, financeira e humana.
Um importante relatório
da McKinsey sobre o estado da arte da globalização financeira, abundantemente
acolhido pelo Financial Times num dos seus preciosos “The BIg Read” (link aqui), vem trazer a esta matéria novas evidências a que
este blogue não pode ficar naturalmente indiferente.
Os números publicados pela
McKinsey (link aqui) são de facto impressionantes (ver gráfico que abre este post). Desde o
pico exuberante de 2007 dos fluxos transnacionais de capital, a queda desses
fluxos está estimada em 65%, tendo atingido no período de 2016 a 2016 7,1% do
PIB mundial, contrastando com os 11,5% de 2000-2010, mesmo que ligeiramente
superior aos 5,3% da década de 1990-2000. Os bancos europeus têm-se destacado no
contributo para essa queda em termos de empréstimos internacionais, emergindo
um comportamento inverso dos bancos japoneses, chineses e canadianos. Também por
estas matérias o “knock-out” europeu é
sintomático, o que significa que também passa por aqui a lenta deriva da queda
de importância económica da Europa. Para além disso, também com largo
contributo dos bancos europeus (cerca de metade), de 2007 a 2016 terão sido “torrados”
dois milhões de milhões de dólares de ativos.
O relatório da McKinsey,
apesar de oferecer evidências relevantes sobre o menor dinamismo dos fluxos de
capital, permanece otimista quanto aos rumos da globalização. A investigação da
consultora vai buscar as raízes desse otimismo às alterações de estrutura nas
tipologias de fluxos de capitais. A mais importante é a evidência de que os
fluxos de investimento direto estrangeiro e de equity aumentaram de 36% do total dos fluxos antes de 2007 para 69%
em 2016. Trata-se de facto de uma mudança que assegura ao sistema financeiro
mundial uma menor volatilidade do que a que tinha formado na antecâmara dos
acontecimentos de 2007. Ao mesmo tempo, a McKinsey junta a evidência de que os
défices externos na economia mundial estão mais contidos (1,7% do PIB mundial
em 2016 contra 2,5% em 2007). Esta convergência dos défices significa menos
combustível para ignições desequilibradoras.
Resta saber se a gestão
prudencial do risco bancário está a ser bem feita e se possíveis perdas terão
hoje melhor cobertura do que a disponível em 2007. A McKinsey é também otimista
nesta matéria, mas aqui sou como S. Tomé.
Por curiosidade, manipulei
os dados consultáveis da McKinsey e comparei a posição de Portugal entre 2007 e
o 1º trimestre de 2016.
Em 2007, do lado das
responsabilidades, ou seja dos stocks financeiros acumulados entrados em Portugal
(estimados em 691 mil milhões de dólares), a estrutura era a seguinte: 46% de
empréstimos internacionais; 24% de títulos de dívida, 19% de investimento direto
estrangeiro e 11% de títulos de equity.
Em 2016, o total
apontava para 556 mil milhões de dólares e a estrutura era a seguinte: 51% de
empréstimos internacionais; 26% de investimento direto estrangeiro; 17% de títulos
de dívida e 5% de equity. Curiosamente, a estimativa de 2016 apontava para 24%
de ativos sobre o estrangeiro sob a forma de IDE, qualquer coisa como 84,5 mil
milhões de dólares.
A minha grande dúvida
reside na natureza do IDE que está materializado nestes números, se estará a reconverter-se
enquanto motor da transformação do perfil de especialização da economia portuguesa
ou se, pelo contrário, será mais do mesmo, fortemente ancorado no imobiliário e
nos não transacionáveis.
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