segunda-feira, 28 de agosto de 2017

ESTÁ A SOCIEDADE PORTUGUESA “HUAWEIZADA”?




(À medida que os casos GALP, HUAWEI e sabe-se lá que mais interligações perigosas entre o público e o privado estarão por aí a aparecer, mais se me forma a ideia de que muita gente perdeu a noção dos limites entre aquelas duas esferas, talvez pela transumância de experiências entre os dois lados…)

Primeiro, foram uns quadros políticos e membros do Governo que não resistiram ao fervor patriótico de ver a seleção na sua saga por terras de França, e face a um patriotismo tão fervoroso que significado tem aceder a uma borla de uma grande empresa portuguesa? Reações sintomáticas de surpresa, talvez a pensar num outro código ético qualquer e, principalmente, pensando lá para os seus botões que porra sempre era a Seleção.

Agora, uns quadros superiores de uma entidade designada de serviços partilhados do Ministério da Saúde, imagina-se que com influência nas compras de equipamentos para os serviços do Ministério, cederam ao canto da HUAWEI e tiveram uma viagem, não sei se também a estadia, paga pelo conglomerado chinês. Entre outras visitas, a imprensa falou de uma grande instituição chinesa de medicina on line, uma das maiores do mundo, equipada com material HUAWEI. Dirão alguns, apenas uma despretensiosa visita de estudo, necessária para alargar as vistas de quem tem tomar de decisões e precisa de estar informado. Resultado, cinco demissões entre esses altos quadros e o Ministro da Saúde aguarda os resultados do inquérito da Procuradoria-Geral da República (todos esperam pelos inquéritos judiciais para tomar posição, será um novo código de conduta para os Ministros?).

Por esta aragem, os neologismos vão suceder-se na língua portuguesa: “galpização”, “huaweização”, “vodafonização”, “microsoftização” e tantas outras que estarão na próxima esquina de um procurador mais atento. Fala-se também de deputados apanhados na bondade da HUAWEI, certamente cientes de que defenderiam os interesses dos seus eleitores que têm telemóveis da marca.

A interpenetração entre a coisa pública e o setor privado calou tão fundo, a transumância entre as duas esferas tem sido tão intensa e as relações entre estruturas de governação e exercício de funções privadas são tão intensas e diversificadas que pelo andar da carruagem o tema inspirador deste blogue corre sérios riscos de por ninguém ser entendido. Eu, que trabalho em empresas privadas há mais de 30 anos e teimo em afirmar que isso não tolhe o meu discernimento relativamente o que cabe ao privado e ao público fazerem, começo a pressentir que a vida pode tornar-se um inferno para quem pretende assumir esse pensamento trabalhando num ou noutro lado. As relações entre o público e o privado necessitam urgentemente de um novo código ético e este blogue estará sempre ao lado dos que nele estão interessados.

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