(Ontem, a propósito
dos dados publicados pela McKinsey Research sobre a dimensão financeira da
globalização, interrogava-me sobre se os rumos do investimento direto
estrangeiro em Portugal estariam a revelar alguma novidade positiva; alertado pelo Dinheiro Vivo para a publicação
do Boletim Estatístico de Agosto do Banco de Portugal observo que a cantilena não
mudou…)
Pelo menos entre os estudiosos da economia
portuguesa que não alimentam uma interpretação meramente ideológica da globalização
(entre os quais me filio), existe um consenso relativamente alargado de que os
sinais promissores de investimento-inovação observados na economia portuguesa, fruto
da persistência de apoios dos Fundos Estruturais, carecem do fator de amplificação
do investimento direto estrangeiro (IDE). A dimensão do investimento empresarial
nacional não parece suficiente para gerar um efeito estruturante em termos de
mudança do perfil de especialização produtiva. A inexistência de grupos empresariais
nacionais com essa vocação de estruturação do sistema produtivo de PME explica
essa carência. Por mais interessante que possa revelar-se o incremento de start-up’s de base tecnológica, essa dinâmica
nunca poderá colmatar a necessária intervenção nesse processo de toda a indústria
incumbente.
Porém, os padrões do IDE em Portugal estão
longe de corresponder a essas expectativas, apesar da sua evolução em magnitude
de valor.
A leitura que o Dinheiro Vivo (link aqui) faz dos dados
publicados pelo já mencionado Boletim de agosto do BP aponta para que a
cantilena permanece largamente estiolada. É o setor financeiro e de seguros que
tem apropriado a esmagadora fatia do crescimento do IDE, neste tempo mais recente
induzido pelas participações de capital no BCP e no BPI. Ou seja, continua a
ser o setor dos não transacionáveis a catapultar o interesse do IDE em Portugal
e os dados sublinhados pelo DV sublinham até o desinvestimento observado na indústria
transformadora. Mau presságio. É verdade que uma forte presença do IDE no setor
bancário, segurador e financeiro em geral poderia, na melhor das hipóteses,
alimentar a inteligência nacional em termos de sistemas de informação, Big Data
e análise de dados. Mas nem sequer essa perspetiva mais positiva estará a manifestar-se.
O desinvestimento na indústria transformadora é manifestamente uma má notícia.
(Fonte: Cálculos próprios a partir das Estatísticas online do BP)
Na tentativa de ir além dos dados do Boletim
de agosto do BP, explorei algumas séries longas publicadas pelo Banco Central,
embora haja que assinalar que o princípio da direccionalidade do IDE (do estrangeiro
para Portugal e de Portugal para o estrangeiro) deixou de ser o processo padrão da 6ª
edição do Manual da Balança de Pagamentos e da Posição de Investimento
Internacional assumido pelo FMI. Nessa medida, consultei dados de ativos e de
passivos do IDE, respetivamente valores de investimento de entidades residentes
realizados no exterior e de valores de investimento de entidades não residentes
em Portugal. Nessa base, calculei valores líquidos (ativos menos passivos) que
são regra geral negativos dado o valor mais elevado das entradas no país. Na
representação gráfica abaixo, as percentagens em relação ao PIB seriam todas negativas,
dado o valor mais elevado dos passivos. Para simplificar a representação do gráfico
tomei valores em módulo, já que só no caso do investimento de carteira o último
valor registado em 31-12.2016 é positivo. A comparação entre o comportamento do
IDE e do investimento de carteira de 1999 a 2016 é sugestiva, pois o primeiro
costuma ser em regra associado a um comportamento mais estável, ao passo que o
investimento de carteira é pressuposto ter um comportamento mais errático.
O comportamento do IDE líquido apresenta uma
tendência relativamente regular para o aumento do seu peso no PIB (em fins de 2016
cerca de 34% do PIB), ao passo que o investimento de carteira tem vindo desde 2009
a cair a pique, acontecendo que em fins de 2016 o valor dos ativos acumulados
excede já em 1% do PIB os passivos acumulados.
Do ponto de vista dos critérios de estabilidade
do sistema financeiro, esta mudança estrutural do andamento das duas variáveis é
positiva. Veja-se o andamento rápido que o peso do investimento de carteira
teve em Portugal de 2005 a 2009, precipitando-se a sua queda a partir daí. Mas
na perspetiva da ajuda necessária que o IDE deveria assumir na reconfiguração
do perfil de especialização produtiva não há otimismo que se justifique. A cantilena
é a mesma. Precisamos de outra música e de outra letra.
Sem comentários:
Enviar um comentário