Já tinha
referido neste blogue o murro no estômago que a leitura de Deus-dará representou
para mim, totalmente virgem em relação a visitas físicas ao Brasil. O estilo caótico
religioso de um romance que na minha humilde capacidade de crítica literária
penso que é único na literatura portuguesa desenvolve-se em sete dias na sociedade
do Rio de Janeiro, sete dias avassaladores a um ritmo impressionante que têm
por epicentro os tumultos e manifestações de 2013. Mas no meio de uma trama que
envolve personagens do mundo luso-brasileiro com múltiplas ascendências e origens
culturais, Alexandra Lucas Coelho reúne pesquisa histórica, sociológica, política.
É um livro que se lê à velocidade dos acontecimentos e dos ritmos dos personagens,
mas é sobretudo uma construção linguística totalmente original que o faz diferente,
como se um português fusão de duas culturas emergisse e nos apontasse que este
vai ser o futuro, com ou sem a merda do acordo ortográfico a vigorar.
Alexandra é
uma personagem rebelde e não hesita por isso em meter-se decidida pelo tema incómodo
da crítica à pretensa brandura dos Descobrimentos portugueses que certamente
lhe irá provocar inimizades e outras reações do tipo. A sua ideia de uma representação
do mundo português que envolva as suas vítimas, lhes dê VOZ e expressão é
corajosa e exigirá uma sociedade portuguesa pronta e capaz para fazer a revisão
desse passado. A sua referência a algumas atrocidades historicamente atribuídas
a Vasco da Gama vai exigir da minha parte alguma pesquisa adicional, pois confesso
a minha ignorância quanto a essa dimensão mais obscura da gesta de Gama.
Se O Meu
Amante de Domingo já tinha sido um verdadeiro murro no estômago, o Deus-dará
acompanhado da entrevista ao DN (link aqui) adquire outro significado.
Sinto falta das
crónicas da Alexandra no Público. A interrupção da sua colaboração com o jornal
terá sido um simples fim de contrato, ponto. Ou terá sido mais qualquer coisa a
ferir as suscetibilidades do Diretor David Dinis e de seus amos?
Tenho as
minhas desconfianças.
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