Quando não dá para o torto, a política é um excelente manancial de surpresas e suspense. Vejam o caso da França atual e da convocação de eleições antecipadas pelo seu presidente Emmanuel Macron após a verdadeira hecatombe em que por lá se transformaram as Europeias (vitória arrasadora da extrema-direita de Marine Le Pen e débacle da sua base partidária para um valor inferior a 15%).
A decisão de Macron é objeto de avaliações totalmente desencontradas (o “velho” Serge July, em coluna no “Libération”, define excelentemente a situação numa dicotomia entre sauve-qui-peut la démocratie ou sauve-qui-peut Macron): para uns, representa mais um sinal de um líder sem rumo e que sempre procura encontrar numa fuga para a frente uma forma de se manter à tona; para outros, constitui o único modo inteligente e corajoso de o dito reagir perante uma afirmação extremista só suscetível de ser enfrentada com sucesso através de uma iniciativa poderosa no sentido de mobilizar as forças democráticas.
As reações partidárias já começaram a surgir, com indicações imediatas de uma possível “Frente Popular” à esquerda (Mélenchon aderirá?) e de uma aliança entre as forças de extrema-direita (tia Marine e sobrinha Marion já se terão encontrado nessa perspetiva), com os republicanos a revelarem divisões inconcebíveis (Ciotti pretende mesmo juntar-se aos extremistas) e Macron a aparecer largamente isolado perante todos e até como “linha vermelha” para alguns. Ainda estamos no tempo dos primeiros milhos, mas tudo aponta para uns dias próximos bastante animados e dominados por dimensões estratégico-táticas de cuja razoabilidade e eficácia dependerá o futuro da França e, em certa medida, do projeto europeu e dos esforços de defesa do Continente.
Sem comentários:
Enviar um comentário