(A partir dos anos 80 do século passado, o crescimento económico puxado pelas exportações, designadamente de produtos manufaturados, impôs-se como modelo preferencial de alocação de recursos e do investimento. Entendia-se que essa via de crescimento tendia a assegurar às economias um nível mais elevado de eficiência dinâmica, materializado sobretudo nas evidências que mostravam que as empresas integradas nos setores não abrigados da concorrência internacional, antes tendo que dar corda aos sapatos para ela se adaptar, apresentavam níveis de produtividade significativamente mais elevados. A experiência dos países asiáticos de industrialização emergente, com a Coreia do Sul à cabeça, mostrava que esse era o rumo, ainda que a experiência coreana evidenciasse a presença de uma política industrial agressiva e fortemente proativa, que explorava as oportunidades do mercado externo, fazendo pela vida, e não acreditando que essa opção resolvia por si só os problemas. O chamado “export led-growth” era então entendido como uma alternativa mais eficaz, relativamente à tentação de, sem ponderar a dimensão do mercado interno, apostar na dimensão da valorização do mercado e da procura interna como veículos de orientação da alocação de recursos. E, obviamente, pensava-se que a evolução por vagas de países emergentes na exportação de produtos manufaturados asseguraria sem dramas que a evolução estrutural dos primeiros emergentes tenderia a abria a oportunidade aos recém-emergentes de explorar os setores de entrada dos primeiros, através da evolução salarial. Embora sem ter perdido acuidade ou importância, o argumento do “export led-growth” está hoje mais matizado, particularmente porque essa via começou a transformar-se num caminho das pedras. É a esse tema que dedico o post de hoje.)
A partir do momento em que o argumento do crescimento puxado pelas exportações ganhou força e consistência e se instalou decisivamente como quadro de orientação dos países que lutavam por uma presença no mercado da globalização, por inerência as dificuldades a enfrentar por essa estratégia teriam de se multiplicar. A explicação é simples. O mercado constituído pela procura de bens manufaturados tem obviamente potencial de crescimento, mas não é ilimitado. A elasticidade-rendimento da procura desses bens não é infinita. A procura de serviços começa a partir de um determinado momento a fazer-se sentir e a representar um desafio para a exportação de manufaturados. E embora a entrada no mercado global se faça por vagas, a verdade é que a vaga para os emergentes é cada vez mais concorrencial e competitiva.
Mas o que é interessante notar é que, além desses fatores inevitáveis, fruto da própria evolução do mercado, a própria estrutura da globalização começa a impor dificuldades adicionais.
O economista Richard Baldwin, já por repetidas vezes citado neste blogue, assinala em dois tweets dois importantes argumentos para justificar a ideia de que o “export led-growth” de produtos manufaturados já não pode ser entendido como um maná ao alcance de todos.
O primeiro argumento sublinha que a data de 2008 tendeu a introduzir alterações no contexto em que o argumento se aplicava e parecia triunfante. Até essa data, o comércio internacional de produtos manufaturados cresceu em permanência acima do produto mundial. Porém, a partir dessa data, a situação inverteu-se e isso terá fundamentalmente relações com o crescimento do comércio internacional de serviços (ver gráfico que abre este post).
O segundo argumento prende-se mais com a estrutura do próprio comércio internacional. A China emergiu como o principal exportador de produtos intermédios manufaturados, tendendo por essa via a afetar a via do crescimento puxado pelas exportações dos que querem entrar nessa via de progressão.
São duas simples razões, mas ponderosas. Ambas tendem a matizar o discurso fácil da entrada nesta via. Ou seja, a concretização dessa opção não é menos exigente do ponto de vista organizativo e da política industrial associada em comparação com a da valorização do mercado interno. De notar, que isto não influencia a validade do argumento central – a via da extroversão parece assegurar melhores condições de eficiência dinâmica às economias. O que muda é a impossibilidade do discurso fácil.
A matéria tem obviamente aplicação em Portugal, pois a chegada aos 50% das exportações no PIB que foi conquista do governo de António Costa, melhor dizendo das empresas que operaram nesse período e responderam aos incentivos de política, é um facto importante, mas que não nos afasta do caminho das pedras que a manutenção ou crescimento dessa percentagem exige.
E não devemos esquecer a novidade de que o dinamismo da procura mundial parece estar hoje concentrado no domínio dos serviços, com destaque para os serviços intensivos em conhecimento.
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