(Em novembro de 2016, como o tempo passa célere, e em 4 de maio de 2022, destaquei neste blogue a meteórica trajetória política de alguém que tinha assinado um livro que considerei na altura um elemento fundamental para compreender o ressentimento de que a base política de Trump se alimenta. O autor era J.D. Vance e a obra Hillbilly Elegy, entretanto já traduzida para português, guião inspirador de um filme não menos eloquente. No post de 2022, escrevia o seguinte na introdução. “Quando li, ainda não havia a tradução portuguesa, a Hillbily Elegy de J.D. Vance, publicada em 2016 e aqui comentada em novembro de 2016, tive uma estranha intuição de que aquela abordagem do declínio inexorável de uma América mítica iria provocar estilhaços sérios na política dos EUA. Não me enganei. Não só grande parte, a bondosa, do Trumpismo remetia para aqueles valores de ressentimento, como o autor J.D. Vance haveria de iniciar uma carreira política. Ora, em linha com essa minha intuição, J.D. Vance acaba de ganhar as primárias dos Republicanos no Ohio, vencendo com cerca de 30%, num conjunto de quatro candidatos. A imprensa americana, com o New York Times e o Washington Post à cabeça, não hesitam em considerar que tal vitória teria sido impossível sem o apoio de Trump. Por isso, a Hillbilly Elegy veicula uma espécie de fantasma de Trump que, para mal dos nossos problemas e inquietações, poderá transformar-se numa presença física real, de regresso à administração de todos os males”. Não estava enganado na minha premonição. J.D. Vance acaba de ser apresentado por Trump como o seu candidato à Vice-Presidência dos EUA, imediatamente na sequência do atentado de que escapou ileso, não sabemos ainda qual o estado real da sua orelha. Esta indicação de Vance vem confirmar de vez a lógica subjacente à ascensão de Trump. Acho que só lendo o Hillbilly Elegy poderemos compreender em toda a sua extensão de implicações o significado que a história dos brancos dos Montes Apalaches assume na tomada de poder por parte de Trump e dos tresloucados do MAGA.)
A escolha do Senador do Ohio para Vice-Presidente candidato obedece assim a uma lógica precisa da América ressentida contra a América das elites. Vance já disse o pior de Trump e assume agora de bom grado o apoio à sua eleição, fazendo agora parte dela. Mas atenção, Vance não é um apoiante qualquer. É alguém com projeto próprio, ele próprio vindo a pulso do mundo do ressentimento e do desespero das oportunidades perdidas e destruídas uma a uma, inexoravelmente.
Ou seja, os Democratas não terão apenas de combater a influência nefasta de um atentado do qual Trump emerge como um herói salvífico. Terão agora também de combater uma Vice-Presidência escolhida a dedo e que, em meu entender, reforça a consistência da própria candidatura de Trump. Aliás, curiosamente, como disso tive intuição em novembro de 2016, impressionado pela leitura do Hillbilly Elegy.
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