(Ninguém pode ficar indiferente a um jogo como o Bélgica-Brasil
de hoje, sobretudo pelo confronto entre as duas partes. Mas além do
espetáculo da emoção, do erro colossal do VAR na penalidade de Company sobre
Gabriel Jesus, o que fica é um manancial de reflexão sobre o futebol como jogo coletivo
em que a organização conta tanto como a excelência individual.)
Reconheço
que o Brasil tem uma equipa de futuro, como talvez nunca tenha tido nos últimos
anos. Mas, peço desculpa aos meus amigos brasileiros, mas o futebol brasileiro conta
para mim muito pouco. Não há maneira de vislumbrar alguém que pense o jogo para
além de uns treinadores de fim-de-semana, que “arranham” algumas ideias, com
muito marketing à mistura (caso paradigmático de Scolari) e uma eterna dependência
do fatalismo e do brilhantismo individual. O futebol brasileiro é para mim a
grande metáfora da nação brasileira. Muito talento individual mas pouca organização
e reduzida capacidade de colocar esse talento ao serviço de um posicionamento
mais coletivo. Como sabemos o desempenho de uma organização mede-se
essencialmente pela sua capacidade de aprender com o seu funcionamento e respostas
a pressões e desafios. O Brasil dá mostras de não aprender com os jogos que faz
e quem disso não é capaz não é capaz de ler o jogo em plena prestação. Hoje, a
seleção brasileira demorou uma eternidade a compreender a trama que Roberto
Martinez tinha montado com o posicionamento da Bélgica no terreno, aprendendo
ele próprio com o erro monumental que foi a sua postura tática face à seleção
do Japão.
A Bélgica mostrou
como o talento individual, na construção dos ataques rápidos e na defesa do
miolo da sua defesa, com um Courtois de outro mundo, pode articular-se
virtuosamente com a excelência da organização, conseguindo disfarçar alguns ativos
menos qualificados que esta seleção apresenta.
E na grande
metáfora que a seleção brasileira permite construir sobre a nação brasileira,
espanta como o talento de Neymar é desperdiçado ao serviço de uma imagem puramente
individual de “brinca na areia”, sempre com imaginação e criatividade
para cavar uma falta. A criatividade e a energia com que a sociedade brasileira
se esgota na procura e navegação nos meandros da corrupção estão bem representadas
na arte da queda da estrela brasileira.
Que
confronto teremos entre as organizações da França e da Bélgica?
A razia dos
outros continentes em matéria de equipas eliminadas é também ela própria uma
metáfora dos elevados défices de capacidade organizativa que campeia por
aquelas paragens da África à América do Sul.
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