(Ninguém imaginaria que na aparente inércia política do PP
espanhol, já com o barco em dificuldades, se ocultasse tamanha fratura.
Mas quando o galego Nuñez Feijoo não foi a jogo, recatando-se sabe-se lá para
quê, tudo se precipitou com facas afiadas e vinganças cobram-se frias.)
Quando os
granizos da corrupção se abatiam sobre o PP de Rajoy e o barco do partido
ameaçava a navegação, a inércia política face à ascensão meteórica do
CIUDADANOS que na Catalunha, simbolicamente, arrumava o PP e se transformava na
formação mais votada parecia sinónimo de grande unidade. É verdade que nos
sinais mais finos a fratura estava lá. Soraya de Santamaría e Cospedal, as mais
próximas de Rajoy, não escondiam o distanciamento entre elas, habilmente
aproveitado pelos fotógrafos mais atentos. Mais ainda, eram conhecidos os
obstáculos que a vice-Presidenta Santamaría colocava sistematicamente ao líder
galego Feijoo, afinal a única liderança do PP que governa alguma coisa com
maioria absoluta. Quando Rajoy se viu surpreendido pela argúcia de Pedro
Sánchez e abandonou, retirando-se para o seu posto de “registrador predial”,
imaginou-se que Feijoo seria a continuidade ideal, pois além da demonstração
galega tinha aquele pretenso ar de modernidade política que o CIUDADANOS se
reivindicava com a figura do seu líder Rivera.
Mas, ainda é
um mistério sabê-lo, Feijoo seja por pressão familiar, seja por um cálculo
político de largo prazo, decidiu não ir a jogo, escudando-se no argumento da
necessidade de não trair a confiança dos galegos. Entretanto e quase em
simultâneo, a liderança do CIUDADANOS foi também traída pelo seu cálculo
político, tendo menosprezado a argúcia política de Sánchez (veremos se dura e
até quando). Ou seja, o contar de espingardas no PP sem Rajoy gozou de maiores
graus de liberdade do que seria de esperar e a morfologia da fratura tornou-se
mais clara. Primeiro a três, Santamaría, Cospedal e Casado, com este último,
até pela sua presença física, a emergir como uma espécie e contra-Rivera. Não
sei se já repararam mas entre as lideranças políticas de hoje parece haver
processos camaleónico-somáticos, eles tornam-se parecidos e Casado e Rivera são
bem parecidos nas suas posturas. A primeira votação realizada permitiu
clarificar a fratura: Cospedal revelou menor poder eleitoral interno do que o
esperado e anunciou o seu apoio a Casado, gerando por isso a clarificação final
esperada para hoje, Casado versus Santamaría.
O que representa
ideologicamente este confronto?
Casado parece
emergir como uma tentativa de colocar a lógica de rejuvenescimento do CIUDADANOS
no interior do PP, aparentemente aderindo a um pensamento mais liberal do que o
próprio Rajoy. Santamaría, pelo contrário, apresenta-se como a representante
dos valores mais profundos do PP em matéria de espanholismo, fazendo jus ao seu
papel de mulher forte do governo de Rajoy, embora não escondendo a perturbação
que a chegada de Casado ao processo lhe provocou. Entretanto, não se conhecem a
qualquer um dos candidatos uma tomada de posição firme quanto à corrupção que
descambou no interior e nas margens do PP.
Nos meandros
do congresso do PP deste fim de semana receia-se que o galego Feijoo sirva fria
a sua pequena vingança, apoiando em cima da hora o candidato Casado. O El Español
(link aqui) refere diligências de última hora do próprio Rajoy no sentido de pelo menos conseguir
que Feijoo se abstenha de interferir na votação.
Moral da
história: a fratura enorme que se cavou nas hostes do PP, que não conseguiu
sequer aumentar a representatividade dos cerca de 3.000 e picos militantes que decidirão
a votação, não parece ter conduzido a uma clarificação do futuro político do PP
em termos de ideias para Espanha. O que, independentemente de alinharmos ou não
com esse espectro político, não é positivo para a democracia espanhola. Como
sabemos, a falta de clarificação política conduz sempre a que as forças populistas
ocupem esse espaço vazio. Pelo menos por agora, à direita em Espanha, o populismo
não tem expressão. De mal o menos.
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