(Expressão feliz para descrever o que provavelmente sentirá
um cidadão britânico que tenha votado sim ao BREXIT e que assiste perplexo à
evolução do pensamento das autoridades políticas do país, perdidas no enredo da
trama e sem preparação. Uma evidência de como o populismo mais extremo
assenta na mentira e na mistificação.)
A expressão não
é minha mas de Kostas Botopoulos que publica no Social Europe (link aqui), um companheiro
incontornável do progressismo nas ideias, um artigo de opinião sobre o chamado NEW
SOFT BREXIT, após a divulgação do CHEQUERS STATEMENT (datado de 6 de julho) do
governo do Reino Unido para tentar salvar a face (texto aqui reproduzido).
À medida que
as sucessivas versões e carantonhas do BREXIT se vão sucedendo, cada vez é mais
visível que o populismo de Farage e seus apaniguados nos Conservadores não
fazia a mínima ideia que fosse sobre as consequências da decisão de abandonar a
União e de como gerir as negociações para o conseguir. Dois argumentos pesaram
na argumentação para votante saudoso das honras do império acolher: a exploração
mais abjeta dos medos da imigração e da invasão dos bárbaros e o desenho de uma
maior soberania, ou seja mais propriamente a recuperação da soberania de
outrora (imperial diga-se). Compreende-se, por isso, que o populismo ululante
do LEAVE tenha ignorado pura e simplesmente todo o conhecimento então produzido
para demonstrar o risco elevado de perdas económicas sérias. Simplesmente não
interessava, já que as dimensões determinantes do voto eram os receios da
imigração e o argumento da recuperação da soberania. Simon Wren-Lewis convoca
para a reflexão dados do último National Centre for Social Research Social
Attitudes survey (link aqui). Seguindo essa base de informação, quase 3/4 dos inquiridos
considera que a imigração tem um impacto positivo sobre a economia e 65% pensa
que a imigração acabou por enriquecer a cultura britânica. Ou seja, longe do
acolhimento que os medos da imigração tiveram no eleitorado do LEAVE.
A posição do
Governo de Theresa May é confrangedora. Primeiro, não se conseguiu impor ao parlamento,
não conseguindo bloquear a possibilidade deste interferir decisivamente na
posição negocial. Segundo, nunca conseguiu impor à União Europeia um padrão
consistente de negociação. Terceiro, começou a ruir com a saída dos Brexiters
mais agressivos, proclamando estes que o sonho acabara. A ideia de um soft BREXIT
ou de um BREXIT ainda mais suave opõe-se agora ao já longínquo HARD BREXIT no
qual May jogara forte sem qualquer resultado ou a um termo do processo sem
qualquer resultado negocial aprovado, bom ou mau para ambas as partes. Puro
devaneio resiliente mas sem qualquer rumo, que só não gera a saída de May
porque os Conservadores não têm qualquer alternativa satisfatória.
Entretanto,
as peripécias da incompetência dos BREXITERS servem pelo menos para ocultar as
verdadeiras razões da degradação sucessiva do estado de bem-estar por terras
britânicas, mentirosamente associadas às interrogações das negociações. Não, a
degradação do estado de bem-estar no Reino Unido, e sobretudo a do seu sistema
nacional de saúde, é tão só e apenas o resultado de uma estúpida e austeritária
política orçamental, sem motivos para tal.
A proposta
de um soft BREXIT continua a revelar-se de difícil aplicação, pois a ideia de
uma quase-União, mantendo um acordo de comércio livre entre a União e o Reino Unido
e um acordo sobre práticas alfandegárias que não exigiria fronteiras terrestres
e marítimas com as Irlandas (de exequibilidade pelo menos discutível face ao
que se vai conhecendo), é matéria que está longe de se aproximar de um culminar
de negociações.
Parece o regresso
do teatro do absurdo. Uma votação que pode ter sérias consequências para a
estabilidade política do Reino Unido e da Europa estava afinal presa a simples
jogos de mentira e marketing eleitoral sem qualquer base sólida para impor a
sua exequibilidade.
É o mundo
que temos e sinto-me LOST IN TRANSLATION, mesmo sem o néon anestesiante de Tóquio.
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