(Compromissos com encontro de amigos no Porto tornam estas
curtas férias ainda mais estranhas e intermitentes e a passagem pelo refúgio da
minha mãe por estes dias leva-me para reflexões algo deprimentes, que só leituras
a preceito conseguem compensar.)
Alguns pensamentos
que se modelam cada vez mais seguramente nas minhas ideias.
O aumento da
esperança de vida equivale frequentemente a uma ilusão de que tal aumento
corresponda à manutenção de qualidade de vida. Não sei se estamos preparados para
o encontro com essa realidade reveladora.
O
envelhecimento com perda de faculdades e quando acompanhado de alguns sinais de
doença já é triste quando individualmente percecionado. É-o muito mais quando é
percecionado a partir de um coletivo, por pequeno que ele seja. Também acho que
nunca ninguém nos ensinou ou preparou para viver essa perceção.
A memória é a
nossa carta de navegação mais preciosa. Quando a começamos a perder, sobretudo
a mais recente, somos transformados em náufragos de oceanos impensados. Também
não estamos preparados para navegar nestes mares.
Chega de
depressão.
Recorro à prosa
e verso de um homem inclassificável, Vítor Silva Tavares, o saudoso responsável
pelo sempre intrépido E ETC dos bons tempos em que tudo era mais fácil, mergulhando
nos Textinhos e Intróitos que me surpreenderam na Feira do Livro de Viana do
Castelo.
Fico por hoje
com alguns dos seus versos, desmistificadores da nossa literatura que enche
abundantemente as estantes de Seixas, excertos apenas:
“Eu queria ser nobel.
Se o foi Saramago
não sou menos que el
Carago.
Eu queria ser augusta
Duchesse Agustina
com muito creme à custa
de margarina.
Eu queria ser maria
velhinha da costa
algarvia.
Quem não tosta?
Eu queria ser pedrosa,
uma inês de papel,
de embrulho cor de rosa
para pastel.
Eu queria ser deixoto
De aquário
a voltear no esgoto
literário.
Eu queria ser o mia
a miar pretoguês
ao balcão onde avia
um romance por mês.
Eu queria ser Llansol
posto a tricotar-me
num quarto de hotel
de charme.
Eu queria ser a linda
teogestão
do livro que ainda
não.
Eu queria ser António
e lobo como ele
a espremer do neurónio
um antunes de fel.”
E muitos
mais
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