segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

A ARMADILHA DOS NÍVEIS INTERMÉDIOS DE RENDIMENTO




(Avisado por Tim Taylor no Conversable Economist, a publicação do World Development Report de 2017 do Banco Mundial traz para o debate do desenvolvimento o tema da armadilha dos países de rendimento médio, e não deixa de ser curioso que uma instituição como o Banco Mundial conceda audiência a teses que contrariam a ideia da convergência …)

Os tempos do desenvolvimento vão diferentes. Há uns tempos discutia-se a chamada armadilha da pobreza (the poverty trap), não apenas ao nível dos indivíduos e das famílias, mas também ao nível dos países. Era uma outra forma de falar da reprodução do subdesenvolvimento. O conjunto de países que não conseguia escapar aos limiares da pobreza absoluta, ou seja que apresentavam uma percentagem elevadíssima de população que se mantinha, por gerações, abaixo do limiar da pobreza ou em torno dele eram considerados em situação de armadilha, reféns de uma situação estrutural. O tema não desapareceu da literatura e do debate sobre o desenvolvimento, mas perdeu notoriedade. Alguns países conseguiram escapar à armadilha e o crescimento económico, embora de forma altamente irrelevante e instável, penetrou também os países pobres. A China transformou o quadro mundial da pobreza absoluta e passou a exigir uma diferenciação incontornável, com China e sem China. A metáfora da armadilha não é totalmente feliz pois quem escapa da mesma resulta de políticas e governação corretas e internas e não necessariamente de algo exterior, alguém que anula a armadilha.

Pois, o tema da “armadilha dos países de rendimento intermédio” (sendo sempre complexo definir o que é intermédio) representa de certo modo a ascensão da “armadilha da pobreza” a um patamar superior. Ou seja, haveria países que, após terem abandonado os limiares de pobreza com rendimentos per capita muito baixos, ficariam amarrados a esse limiar de rendimento deixando de convergir com os mais avançados. Por outras palavras, e sem grandes preocupações de rigor quanto aos diferentes conceitos de convergência que se definem em economia, esses países em posição de armadilha deixariam de crescer a ritmos superiores às economias avançadas, mesmo que controlando o facto de por razões estruturais poderem não aspirar aos mesmos níveis de produto per capita e de produtividade que as economias avançadas. Ora, tem significado ser o Banco Mundial a organização internacional a reconhecer a não convergência como um princípio generalizado e não observado para um conjunto determinado de países.

O gráfico fundamental para se compreender o fenómeno compara a situação relativa dos países em 1970 e 40 anos depois em 2010. A posição relativa dos países é determinada em percentagem do seu rendimento per capita face ao rendimento per capita das economias mais avançadas. Assim, um país de rendimento intermédio baixo é entendido como pertencendo ao grupo de países com rendimento per capita entre 5 a 15% do rendimento per capita dos mais avançados.

O gráfico mostra que para um grupo substancial de países de rendimento intermédio baixo em 1970, 40 anos depois está classificado como países de rendimento baixo abaixo de 5% dos mais avançados. A exceção do costume é a Coreia do Sul que passa em 40 anos de país de rendimento intermédio baixo para país de rendimento elevado. Tantas vezes ouvi esta história e eis que regressa.

O World Development Report de 2017 que publica esta informação é dedicado ao tema da Governação e da Lei, o que anuncia um conjunto de razões para explicar a armadilha do rendimento intermédio. E aqui voltamos ao problema da causalidade em desenvolvimento. O relatório publica evidência segura que mostra que, por exemplo, entre os que escaparam à armadilha do rendimento intermédio, os níveis de combate à corrupção e de accountability são mais intensos do que nos permaneceram nesse escalão ou regrediram. Mas será que essa evidência a posteriori significa que são esses fatores a explicar a superação da armadilha? Muitas vezes, nem um milhão de regressões (parafraseando um artigo célebre de Xavier Sala-i-Martin) consegue resolver o problema. E ficamo-nos por aqui.

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