(Avisado por Tim Taylor
no Conversable Economist, a publicação do World Development Report de 2017 do
Banco Mundial traz para o debate do desenvolvimento o tema da armadilha dos países
de rendimento médio, e não
deixa de ser curioso que uma instituição como o Banco Mundial conceda audiência
a teses que contrariam a ideia da convergência …)
Os tempos do desenvolvimento vão diferentes. Há uns tempos discutia-se a chamada
armadilha da pobreza (the poverty trap),
não apenas ao nível dos indivíduos e das famílias, mas também ao nível dos países.
Era uma outra forma de falar da reprodução do subdesenvolvimento. O conjunto de
países que não conseguia escapar aos limiares da pobreza absoluta, ou seja que apresentavam
uma percentagem elevadíssima de população que se mantinha, por gerações, abaixo
do limiar da pobreza ou em torno dele eram considerados em situação de
armadilha, reféns de uma situação estrutural. O tema não desapareceu da
literatura e do debate sobre o desenvolvimento, mas perdeu notoriedade. Alguns
países conseguiram escapar à armadilha e o crescimento económico, embora de
forma altamente irrelevante e instável, penetrou também os países pobres. A
China transformou o quadro mundial da pobreza absoluta e passou a exigir uma
diferenciação incontornável, com China e sem China. A metáfora da armadilha não
é totalmente feliz pois quem escapa da mesma resulta de políticas e governação
corretas e internas e não necessariamente de algo exterior, alguém que anula a
armadilha.
Pois, o tema da “armadilha dos países de rendimento intermédio” (sendo
sempre complexo definir o que é intermédio) representa de certo modo a ascensão
da “armadilha da pobreza” a um patamar superior. Ou seja, haveria países que,
após terem abandonado os limiares de pobreza com rendimentos per capita muito baixos, ficariam
amarrados a esse limiar de rendimento deixando de convergir com os mais
avançados. Por outras palavras, e sem grandes preocupações de rigor quanto aos diferentes
conceitos de convergência que se definem em economia, esses países em posição
de armadilha deixariam de crescer a ritmos superiores às economias avançadas,
mesmo que controlando o facto de por razões estruturais poderem não aspirar aos
mesmos níveis de produto per capita e
de produtividade que as economias avançadas. Ora, tem significado ser o Banco
Mundial a organização internacional a reconhecer a não convergência como um
princípio generalizado e não observado para um conjunto determinado de países.
O gráfico fundamental para se compreender o fenómeno compara a situação
relativa dos países em 1970 e 40 anos depois em 2010. A posição relativa dos países
é determinada em percentagem do seu rendimento per capita face ao rendimento per
capita das economias mais avançadas. Assim, um país de rendimento intermédio
baixo é entendido como pertencendo ao grupo de países com rendimento per capita
entre 5 a 15% do rendimento per capita dos mais avançados.
O gráfico mostra que para um grupo substancial de países de rendimento
intermédio baixo em 1970, 40 anos depois está classificado como países de
rendimento baixo abaixo de 5% dos mais avançados. A exceção do costume é a Coreia
do Sul que passa em 40 anos de país de rendimento intermédio baixo para país de
rendimento elevado. Tantas vezes ouvi esta história e eis que regressa.
O World Development Report de 2017 que publica esta informação é dedicado ao tema da Governação e da Lei, o que
anuncia um conjunto de razões para explicar a armadilha do rendimento intermédio.
E aqui voltamos ao problema da causalidade em desenvolvimento. O relatório publica
evidência segura que mostra que, por exemplo, entre os que escaparam à
armadilha do rendimento intermédio, os níveis de combate à corrupção e de accountability são mais intensos do que
nos permaneceram nesse escalão ou regrediram. Mas será que essa evidência a
posteriori significa que são esses fatores a explicar a superação da armadilha?
Muitas vezes, nem um milhão de regressões (parafraseando um artigo célebre de
Xavier Sala-i-Martin) consegue resolver o problema. E ficamo-nos por aqui.
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