terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

A MODINHA DA OCDE




(Chega a causar dó o modo como Governo e oposição aceitam dançar a modinha da OCDE, uma espécie de agora viro eu, agora viras tu, onde é necessário distinguir com clareza o que é o contributo da organização para a análise e outra coisa o teor das suas recomendações …)

A publicação de relatórios OCDE sobre a economia portuguesa ou sobre algumas dimensões setoriais do nosso bem-estar material já se transformou num ritual da política portuguesa. Umas vezes dá jeito ao governo, outras à oposição, cada um dança a modinha à sua maneira em função dos seus interesses de momento e a estrutura técnica da organização internacional lá vai financiando a sua atividade.

A OCDE é talvez a organização internacional em que o valor e até inovação da análise são depois desperdiçados num ideário de política demasiado afunilado para corresponder à abertura de perspetivas que os seus diagnósticos e surveys proporcionam a um leitor interessado no aprofundamento analítico das situações.

O estudo económico de 2017 sobre a economia portuguesa não foge a essa regra. Ele traz-nos a síntese de diferentes dimensões da evolução da economia portuguesa pós resgate da TROIKA, reunindo informação sobre a qual é crucial termos uma visão de conjunto, poupando-nos um esforço pesado de sistematização de fontes. Mas quando passamos ao domínio das recomendações, a organização internacional é fiel aos seus princípios liberalizantes e desregulamentadores das economias, que aliás entram em fundamental contradição com outros trabalhos e posições da organização que contrariam essa visão das economias. Não é coisa que não aconteça noutras organizações. Veja-se o caso do FMI em que alguns trabalhos de investigação macroeconómica não têm depois a devida correspondência nas políticas de ajustamento cofinanciadas pela instituição. E é também o caso da contradição existente entre algumas DG da Comissão Europeia.

O ministro das Finanças Mário Centeno fez muro contra algumas previsões e extrapolações que a OCDE realiza a partir do seu relatório, fixando arraiais de novo na narrativa do desemprego e do emprego, antecipando o abandono do ciclo de taxas de desemprego a dois dígitos e focando-se na variação “criação de emprego” como a narrativa fundamental do Governo para medir a performance macroeconómica induzida pelas políticas públicas que promove, tanto mais que os ritmos de crescimento económico anunciados não dão para grandes foguetes. É claro que quando ventilamos com mais minúcia o emprego que se vai criando não podemos ficar propriamente entusiasmados com a performance da economia portuguesa, mas não há dúvida de que o ritmo de variação do emprego é bem mais promissor do que propriamente o ritmo de crescimento económico.

Do relatório retiro essencialmente dois gráficos, escolhidos por razões bem diferentes.

O primeiro está relacionado com a minha fúria deste princípio de noite gerada por quase três horas de corte de energia provocado por avaria no quarteirão residencial em que vivo. Que não é totalmente novo, já que no último fim-de-semana houve avarias do género pelas mesmas horas. Segundo o relatório da OCDE, Portugal tem um dos mais elevados preços da energia elétrica da OCDE, neste caso medido pelo preço pago pelas PME. Sendo a energia ainda essencialmente um bem não transacionável, o prelo da energia deveria refletir o preço relativo mais baixo associado ao mais baixo nível de desenvolvimento económico do país. E somos conduzidos ao já nosso conhecido tema das rendas.


O segundo deveria representar o foco de toda a atividade governativa futura: como ultrapassar o baixo nível de investimento ainda observado na economia portuguesa, o qual está a 40% do observado no início da década de 2000. Com este contexto de investimento, estaremos a fazer cócegas ao crescimento económico e a discutir décimas.

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