(Chega a causar dó
o modo como Governo e oposição aceitam dançar a modinha da OCDE, uma espécie de agora viro eu, agora viras
tu, onde é necessário distinguir com clareza o que é o contributo da organização
para a análise e outra coisa o teor das suas recomendações …)
A publicação de relatórios OCDE sobre a economia portuguesa ou sobre
algumas dimensões setoriais do nosso bem-estar material já se transformou num
ritual da política portuguesa. Umas vezes dá jeito ao governo, outras à oposição,
cada um dança a modinha à sua maneira em função dos seus interesses de momento
e a estrutura técnica da organização internacional lá vai financiando a sua
atividade.
A OCDE é talvez a organização internacional em que o valor e até inovação
da análise são depois desperdiçados num ideário de política demasiado afunilado
para corresponder à abertura de perspetivas que os seus diagnósticos e surveys proporcionam
a um leitor interessado no aprofundamento analítico das situações.
O estudo económico de 2017 sobre a economia portuguesa não foge a essa regra.
Ele traz-nos a síntese de diferentes dimensões da evolução da economia
portuguesa pós resgate da TROIKA, reunindo informação sobre a qual é crucial
termos uma visão de conjunto, poupando-nos um esforço pesado de sistematização
de fontes. Mas quando passamos ao domínio das recomendações, a organização
internacional é fiel aos seus princípios liberalizantes e desregulamentadores
das economias, que aliás entram em fundamental contradição com outros trabalhos
e posições da organização que contrariam essa visão das economias. Não é coisa
que não aconteça noutras organizações. Veja-se o caso do FMI em que alguns
trabalhos de investigação macroeconómica não têm depois a devida correspondência
nas políticas de ajustamento cofinanciadas pela instituição. E é também o caso
da contradição existente entre algumas DG da Comissão Europeia.
O ministro das Finanças Mário Centeno fez muro contra algumas previsões e extrapolações
que a OCDE realiza a partir do seu relatório, fixando arraiais de novo na narrativa
do desemprego e do emprego, antecipando o abandono do ciclo de taxas de desemprego
a dois dígitos e focando-se na variação “criação de emprego” como a narrativa
fundamental do Governo para medir a performance macroeconómica induzida pelas
políticas públicas que promove, tanto mais que os ritmos de crescimento económico
anunciados não dão para grandes foguetes. É claro que quando ventilamos com
mais minúcia o emprego que se vai criando não podemos ficar propriamente
entusiasmados com a performance da economia portuguesa, mas não há dúvida de
que o ritmo de variação do emprego é bem mais promissor do que propriamente o ritmo
de crescimento económico.
Do relatório retiro essencialmente dois gráficos, escolhidos por razões bem
diferentes.
O primeiro está relacionado com a minha fúria deste princípio de noite
gerada por quase três horas de corte de energia provocado por avaria no quarteirão
residencial em que vivo. Que não é totalmente novo, já que no último
fim-de-semana houve avarias do género pelas mesmas horas. Segundo o relatório
da OCDE, Portugal tem um dos mais elevados preços da energia elétrica da OCDE,
neste caso medido pelo preço pago pelas PME. Sendo a energia ainda
essencialmente um bem não transacionável, o prelo da energia deveria refletir o
preço relativo mais baixo associado ao mais baixo nível de desenvolvimento económico
do país. E somos conduzidos ao já nosso conhecido tema das rendas.
O segundo deveria representar o foco de toda a atividade governativa futura:
como ultrapassar o baixo nível de investimento ainda observado na economia
portuguesa, o qual está a 40% do observado no início da década de 2000. Com
este contexto de investimento, estaremos a fazer cócegas ao crescimento económico
e a discutir décimas.
Sem comentários:
Enviar um comentário