quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

AUGE E OCASO DA I&D EM PORTUGAL?




(A recente publicação pela OCDE dos Main Science and Technology Indicators permite seguir o comportamento da economia portuguesa nos últimos 14 anos nesta matéria, e o que ressalta dos resultados não é tão promissor como parecia há alguns anos)

É conhecido que Portugal gozou de algum estado de graça nos radares da ciência e tecnologia seja europeus, seja da OCDE. A despesa bruta de I&D em percentagem do PIB começou no início da década de 2000, a densidade do número de investigadores face à força de trabalho também aumentou, as publicações científicas dispararam e, após alguma inércia, a repartição entre I&D financiada em termos públicos e I&D financiada pelas empresas começou também a dar sinais de que podia finalmente ir abandonando o primado da I&D pública.

É conhecido que parte desse estado de graça se deve à persistência do saudoso Mariano Gago, o que é interessante é que o próprio pai da carta de alforria da ciência como política pública só tardiamente reconheceu a importância da translação do conhecimento para o meio empresarial.

Ora, agora que emerge informação que cobre todo o período negro da austeridade a todo o preço e que os anos de 2014 e 2015 surgem já representados nos dados OCDE, é interessante avaliar se o tal estado de graça permanece. E desta vez há mixed feelings.

Os dados da despesa bruta de I&D em percentagem do PIB têm o seu apogeu em 2009, mas a partir daí parece desenhar-se um ocaso desse esforço. Bom, pode eventualmente dizer-se que houve problemas de medida das despesas de I&D efetivamente contabilizadas com rigor enquanto tal e que parte do surto em direção ao apogeu de 2009 se deve a melhorias de medida. Admito que possa ter havido correções desse tipo. Mas o comportamento a partir de 2009 é mais de ocaso do que de correção de ponto de situação. Entretanto, o gráfico abaixo que descreve a evolução do número de investigadores por milhar de indivíduos inscritos como força de trabalho permite concluir que em termos de recursos humanos o esforço prosseguiu e que não houve propriamente ocaso. Mas atenção que esse crescimento dos recursos humanos em atividades de I&D pode refletir quebra de produtividade da investigação. Já o referi neste blogue em post anterior. Para descobrir uma nova ideia há sinais de que é necessário um maior esforço em termos de investimento humano.



Dirão os mais otimistas que não é propriamente um ocaso mas um ajustamento estrutural positivo. Afinal o peso da I&D financiada pelo governo diminuiu e, em contrapartida, aumentou a I&D financiada pela indústria. O sistema de inovação em Portugal estaria a alinhar finalmente pelas tendências mundiais e europeias.


Porém, quando colocamos no mesmo gráfico, em termos de peso no PIB, a despesa bruta de I&D e a I&D financiada em termos empresariais, vemos que também esta acusou uma perda de esforço em termos de afetação de recursos. Uma simples imagem permite esclarecer os “mixed feelings”: o ajustamento estrutural (positivo) favorável à I&D empresarial necessitaria de um maior esforço de investimento, o que não está a acontecer.

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