(In Facundo Alvaredo e outros, Global Inequality Dynamics: New Findings from WID world", NBER Working Paper 23119)
(A investigação
de Piketty e do grupo de economistas que com ele partilha investigação, agora já
sem o saudoso Tony Atkinson, continua a trazer-nos informação cada vez mais
fina e rigorosa, contribuindo
para que a desigualdade se afirme como tema crucial em economia e não como matéria
abstrata carenciada de evidência …)
Com caminho aberto por um conjunto de economistas que nunca desprezou o rigor
das evidências para construir interpretações sólidas sobre as mesmas, o economista
francês Thomas Piketty logrou obter com a sua obra de 2014 uma notoriedade
inesperada. Mas essa notoriedade não se terá repercutido apenas na sua conta
bancária e prestígio internacional. Projetou-se, e isso é que é importante, na
criação de condições para mais trabalho de investigação com pontes entre Paris (Sorbonne)
e a Califórnia (Berkeley), passando ainda por outras amarrações sobretudo Oxford
no Reino Unido.
O grupo integra essencialmente os europeus Piketty, Fecundo Alvaredo e
Lucas Chancel e os americanos Emmanuel Saez e Gabriel Zucman. Do seu valioso trabalho,
que beneficiou muito do contributo notável de Anthony Atkinson, entretanto desaparecido,
resultou sobretudo o acesso público a uma valiosa base de dados, a WID.world (World
Wealth and Income database). E pela própria designação da base de dados se
percebe como é importante o facto das evidências reunidas com afinco e extrema
paciência (sem esquecer a transparência perante os pares) envolver o tratamento
simultâneo das variáveis “riqueza” e “rendimento”, aliás no seguimento do que constituiu
sobretudo o alcance inovador da obra de Piketty (O Capital no Século XXI). Para
além dessa valia de integrar dados sobre a riqueza (fundamental para se
compreender a relação entre o stock e o fluxo), o trabalho daquele conjunto de
economistas vale também por outros aprofundamentos relevantes, como o é a utilização
combinada de dados provenientes das Contas Nacionais, dos impostos e política
fiscal dos países e da base de inquéritos que representava até há bem pouco
tempo a fonte principal da origem de dados. Nesta matéria, sabe bem confirmar o
grande apreço destes economistas pelo trabalho pioneiro de Simon Kuznets nos
anos 50, contrastando com outras iluminárias que não fazem a mínima ideia do
alcance desses trabalhos de Kuznets, de reconstituição meticulosa de séries
macroeconómicas.
Por agora, o trabalho do grupo tem incidido sobretudo na análise comparativa
da desigualdade entre os EUA, a França, o Reino Unido e a China, anunciando esta
última que a base de dados vai começar a incorporar progressivamente outras
economias emergentes. Essa progressão vai ser crucial para compreender os
matizes da evolução do capitalismo contemporâneo.
O curto artigo de fevereiro de 2017 publicado pelo grupo no National
Bureau of Economic Research (USA) é importante para fixarmos o estado
da arte em matérias de grandes tendências nas economias mais avançadas. Por aí
se compreende a tendência inexoravelmente evidenciada para o crescimento da
percentagem de rendimento apropriada pelo 1% mais rico destes países e para o
aumento do rácio “Riqueza privada líquido /Rendimento Nacional”. Os dados
mostram ainda que, com exceção da resiliente França, os 50% mais pobres têm
vindo a perder progressivamente quota de rendimento, evidenciando uma séria
quebra das perspetivas de melhoria de condições pela parte mais desfavorecida
das populações.
(In Facundo Alvaredo e outros, Global Inequality Dynamics: New Findings from WID world", NBER Working Paper 23119)
Entretanto, a China prossegue a ritmo extremamente rápido o caminho para
uma desigualdade crescente, a que não é estranho o processo de “privatização” da
propriedade que vai acontecendo no estranho comunismo chinês.
(In Facundo Alvaredo e outros, Global Inequality Dynamics: New Findings from WID world", NBER Working Paper 23119)
Mas talvez a ideia mais interessante e com maior potencial de discussão do
ponto de vista das políticas públicas é a tese sustentada pelos autores,
segundo a qual contrariar o agravamento da desigualdade terá menos eficácia por
via da redistribuição ex-post (impostos
e transferências) do que pugnar por uma distribuição mais equilibrada de ativos
primários, tais como o capital humano, o capital financeiro e o poder de barganha
no mercado de trabalho. Aliás, nesta matéria, o grupo acaba por seguir de perto
algumas propostas que Piketty tem realizado para promover uma rediscussão mais intensa
e alargada da social-democracia europeia. Ou seja, que as políticas de educação,
as reformas no mercado de trabalho (salário mínimo incluído), modelos de governação
nas empresas e mais representatividade do trabalho na vida das empresas
constituem vias sobre as quais se tem de trabalhar de modo mais persistente.
Concluem os autores que, no seio de uma tendência geral de agravamento da desigualdade
na distribuição do rendimento e da riqueza, são as condições das políticas e das instituições de cada país que explicam os diferentes ritmos e intensidades
com que esse agravamento se concretiza. O que
significa que há margem de manobra para contrariar o peso da tendência.
(Alterado o último parágrafo em 16.02.2017).
(Alterado o último parágrafo em 16.02.2017).
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