segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

ADEUS EUROPA




(É impossível não associar o filme de Maria Schrader sobre o exílio de Stefan Zweig em plena emergência do nazismo ao momento de intolerância e de desmembramento potencial da Europa, mas apesar disso estamos perante um documento precioso mesmo para os conhecedores muito parciais, como eu, da obra de Zweig…)

Sou um leitor bastante limitado da obra de Zweig. A memória traz-me apenas O Mundo de Ontem, agora reeditado pela Assírio e Alvim. Mas o filme de Maria Schrader é uma peça de grande alcance para compreendermos o drama e os dilemas dos intelectuais contemplativos e não ativistas face à emergência dos sinais da barbárie, neste caso a emergência dos tentáculos do nazismo por vários cantos da Europa. Drama e dilema que conduzem Stefan Zweig ao suicídio conjunto, em Petrópolis, na serra do Rio de Janeiro, com a segunda mulher Lotte, expressão máxima da falta de energia que lhe assiste para iniciar um mundo a partir do zero, apesar dos momentos de felicidade no Brasil, então (e sempre) apresentado como o país do Futuro e otimisticamente encarado por Zweig como o protótipo da integração.

Gosto no filme sobretudo no encontro em Nova Iorque com a sua primeira mulher (interpretação de excelência de Barbara Sukowa), salva por uma lista de Eleanor Roosevelt, espantosamente filmado em Lisboa, com um manto de neve a envolver a estadia, e no qual Stefan Zweig se consome por dentro com o dilema de escrever ou de tratar de pôr a salvo inúmeros amigos que lhe suplicam um visto ou uma outra qualquer solução. E também o ambiente do Congresso de Escritores em Buenos Aires onde o dilema do contemplativo perante o ativismo arrebatado de outros é preciosamente colocado.

Claro que para os especialistas da Sétima Arte ficarão sobretudo os dois planos sequência do prólogo e do epílogo, sobretudo do último, de que Ricardo Vieira Lisboa no À Pala de Walsh nos apresenta uma refinada caracterização (ver link aqui).

Para um amante de segunda feira de Carnaval mais mandriona do que foliona, o filme de Schrader é comovente e o pior é que me estimula a ler o ensaio que Zweig escreveu sobre o Brasil e outras mais.

Esperemos que o filme de Schrader não se torne icónico de uma nova desintegração da Europa.

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