(A convergência
de matérias profissionais e reencontros familiares levou-me à grande exposição na
Gulbenkian sobre Almada Negreiros, “Uma maneira de ser moderno” ontem inaugurada,
e sempre que vejo uma
mostra desta magnitude fico mais consciente da incapacidade portuguesa de avaliar
a dimensão dos seus génios)
A emergência da modernidade em Portugal intriga-me, sobretudo pelo contexto
nacional bafiento e opressor em que ela emergiu. A compreensão dessa emergência
ficaria comprometida sem entendermos bem a dimensão de Almada Negreiros cujo modernismo
ainda foi objeto de captura e recuperação pelo regime, embora não suficientemente
opressora para domar a irreverência da personalidade.
A mostra da Gulbenkian é sobretudo relevante para se ter uma perceção da
vastidão física e de linguagens que a obra de Almada Negreiros veicula, tão bem
sublinhada na metáfora daqueles olhos grandes que pontificam em alguns dos seus
desenhos e telas. Não só a ideia do olho e do olhar como símbolo do acesso ao conhecimento,
mas sobretudo a dimensão desse olhar transportando-nos para visão lata da
realidade que a diversidade das suas linguagens artísticas tão bem representa.
A relativamente longa vida de Almada, noventa e sete anos, permitiu-lhe
conviver e colaborar com sucessivas gerações de modernismo em Portugal, o que
faz da sua obra um repositório de colaborações inter-escolas, linguagens e idades,
difícil de encontrar noutros domínios.
Se a memória não me atraiçoa, terá sido José Augusto França quem referiu
que Almada é o expoente da máxima “sem mestres, mas também sem discípulos” e
essa ideia marca bem as dificuldades de estar na fronteira da arte num país com
esta dimensão e pequenez.
Acredito em convergências cósmicas e, de tarde, num curto e saudável percurso
pela Lx Factory, apanhei na Ler Devagar a muito recente “Obsessão da
Portugalidade” de Onésimo Teotónio de Almeida. Onésimo é uma das minhas referências
para entender a “Açorianidade” e a quem tantas vezes recorri para contextualizar
alguns trabalhos nos Açores. Do alto dos seus mais de quarenta anos na América,
portanto com uma visão simultaneamente de fora e de dentro do país, a análise
da portugalidade de Onésimo parece-me promissora.
O que pensará ele das desventuras e amarguras dos espíritos livres
americanos?
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