sexta-feira, 31 de março de 2017

AO JEITO DE CONTRASTE


António Lobo Xavier – um homem que anda pela banca, agora até como vice do BPI, e um reconhecido militante do CDS – também se pronunciou na última Quadratura sobre o negócio do Novo Banco, ainda antes de ele estar concluído – como ocorreu hoje – e de serem conhecidos os seus contornos integrais. Seguem, por serem esclarecedoras e concludentes, as suas afirmações mais dirigidas e contrastantes.

“Se quiser uma frase sobre o negócio tal como ele é conhecido pelos jornais, a minha opinião pessoal é a seguinte. Havia duas hipóteses, de acordo com as regras aplicáveis – porque anda aí uma grande vozearia que despreza completamente as regras legais, os acordos e o direito comunitário e o direito português –, havia duas hipóteses: liquidar o banco, o que seria um processo complicadíssimo, traumático, com efeitos absolutamente imponderáveis ou vender o banco numa situação em que não houvesse previsão de que os contribuintes portugueses tivessem que pagar mais do que o que já têm que suportar. Aparentemente a solução assegura isso, ou seja, não que ninguém vai ter que suportar nada, não é, como oiço dizer, mas que aquilo que os contribuintes têm a suportar já está suportado, aliás está suportado especialmente pelo sistema bancário porque o sistema financeiro português, inexplicavelmente e de uma forma desproporcionada, é que suporta o Fundo de Resolução.”

“Eu acho que vender o Novo Banco nas condições que vejo no jornal põe fim a um processo que é muito importante que termine do ponto de vista das relações externas de Portugal, do ponto de vista da relação de Portugal com os mercados. Acho uma solução, acho que o Governo conseguiu, lamento dizê-lo – lamento quer dizer neste sentido de que sou obrigado a reconhecer que é uma solução equilibrada –, que não piora os efeitos de decisões anteriores, pelo contrário, e fecha mais um processo – para além de ter fechado a Caixa Geral de Depósitos –, fecha mais um processo que coloca Portugal melhor.”

“Eu também tenho visto esse espanto. Mas nós acabamos de fechar a capitalização da Caixa Geral de Depósitos, onde se percebeu quais eram as condições draconianas impostas para que o Estado lá pudesse pôr dinheiro, e fecha-se essa porta, chegamos ao Novo Banco e achamos inacreditável que se proponha que se o Estado quer ficar com 25% não tenha influência na gestão. Quer dizer, não são as regras do jogo já conhecidas? Eu acho que há uma demagogia no discurso sobre esses temas verdadeiramente insuportável. As pessoas não são questionadas pelas suas opiniões – políticos, deputados, aliás de todos os partidos. Mas há alguma novidade nisso? As regras da concorrência o que obrigam... – para evidentemente que o Estado não subsidie, prejudicando a concorrência, ilimitadamente os bancos, foi preciso pôr algum limite. Eu cumprimento, se a solução for esta – não é uma solução que me agrade por razões que vêm de trás –, do ponto de vista da solução que estava ao alcance do Governo cumprimento o Governo pela solução.”

MACROECONOMIA E DESIGUALDADE




(Os trabalhos de Piketty, Saez e Zucman continuam a dar frutos, trazendo-nos novas pontes para uma convergência coerente dos estudos da macroeconomia e da desigualdade, procurando recuperar o tempo perdido da divergência entre a sofisticação crescente da macroeconomia e a tolerada análise das condições de desigualdade…)

A parceria transatlântica entre Piketty, em Paris, e Saez em Berkeley nos EUA e Zucman em Londres, sob o manto inspirador do desaparecido e saudoso Tony Atkinson (Oxford), é das mais bem-sucedidas experiências de cooperação académica, a que não foi estranha a passagem de Piketty pelos EUA e o fabuloso êxito editorial do Capital no século XXI do primeiro.

A divergência entre o estudo da macro e da desigualdade não é legado original da economia política. A distribuição do rendimento já fez parte do corpo central da macroeconomia e foi o mainstream neoclássico que destruiu essa herança intelectual. Entre outras razões por questões de natureza ideológica. Retirar a desigualdade na distribuição do rendimento “purificava” a macro, retirava-lhe a possível carga dos valores e daí a uma pretensa “cientificização” da disciplina foi um pequeno passo que muitos deram prazenteiros e com alívio.

No artigo recente no VOX EU, os três economistas trazem para a discussão um outro dado que resulta da forte incoerência que existe entre as fontes tradicionais estatística do estudo da macro e da desigualdade. Entre as contas nacionais que são a base estatística da macroeconomia e as bases que servem regra geral de suporte ao estudo da desigualdade, inquéritos ao consumo ou ao rendimento das famílias e os dados fiscais, há fortes incongruências entre as três fontes.

Ora, é na procura de uma coerência entre as três fontes, contas nacionais, dados do fisco e inquéritos às famílias, que o trabalho dos três economistas se tem notabilizado, restaurando uma tradição que vinha dos trabalhos insanos de Simon Kuznets e que é agora recuperada. Piketty, Saez e Zucman são o Kuznets do século XXI que a economia necessitava para estabilizar bases estatísticas que nos permitam seguir com mais rigor a evolução da desigualdade. Isso é fundamental para que as políticas públicas inscrevam a questão dos seus impactos sobre a desigualdade como um princípio fundamental de avaliação ex-ante e de monitorização- aprendizagem – correção das políticas públicas. Entre outras vias promissoras está o estudo da desigualdade na distribuição do rendimento antes e depois de impostos e transferências e a possibilidade de isolar a posição da mulher no rendimento da família, permitindo avançar os estudos de género.

O artigo da VOX EU anuncia resultados decorrentes deste esforço de construção integrada de uma base empírica para o estudo da desigualdade, ainda largamente centrados na economia americana, que nos vão ajudando a perceber os ventos que por ali vão emergindo.

O gráfico que abre este post é revelador da divisão que está instalada na sociedade americana. É confrangedor o comportamento da metade inferior das famílias recebedoras de rendimento. A degradação da sua posição relativa é manifesta e inequívoca.

O gráfico acima pormenoriza esta degradação relativa e situa-a face ao comportamento do 1% mais rico.

Há gráficos (imagens) que falam por si, por mais limitações que tenhamos em matéria interpretativa deste tipo de ferramentas.

A GARANTIA DO TEIXEIRA


Ao ouvir ontem as declarações do meu amigo Fernando Teixeira dos Santos (FTS), com chamada de capa no DN, apeteceu-me ressuscitar aqui a defunta rubrica do “Porque não de te calas?”. Também poderia remeter para um meu post recente em que se deixava no ar uma perplexidade sobre estranhos comportamentos de algumas figuras públicas, no caso com a agravante que se sabe quanto ao complexo papel de FTS naqueles anos de ministro das Finanças.

E o que disse FTS? Cito três das suas principais referências: “É um encargo que os bancos vão ter que suportar nos próximos trinta anos que vai ser repercutido nos cidadãos, nos consumidores de serviços financeiros. Nós vamos todos pagar isto, vamos todos pagar isto, não é?” / “É uma forma de partilhar o risco da operação em 25%. É uma forma também de garantir que o Estado vai suportar, por essa via, aquilo que possam ser as vicissitudes no futuro do Novo Banco. (...) É uma garantia na medida em que o Estado como acionista assume aqui um risco, que pode correr bem ou pode correr mal.” / “Não faz sentido o Estado não ter direito de voto.”

A meu ver, a questão é esta: terá ou teria FTS alguma inside information sobre os termos do negócio em vias de fecho relativamente ao Novo Banco? E se sim, o que não lhe agrada e o que teria ele feito diferente? E se não, para além do que todos conhecemos pelos jornais que é sempre parcial ou truncado, porque veio a terreiro acrescentar ao ruído dizendo coisas improcedentes (ou, pelo menos, pouco fundamentadas e rigorosas), alimentando assim dispensáveis especulações que já temos em dose bastante por esse País fora?

SALTO PARA O DESCONHECIDO (III)


Day one. Terminou sem nada a registar de significativo – uns a celebrar triunfalmente o magnificent moment, outros a sugerir a (im)possibilidade de um divórcio amigável e todos a assinalarem que Theresa May is going home e a correspondente abertura de uma nova era – o primeiro dia do resto da vida da União Europeia e do Reino Unido. Ficam a faltar os outros, os piores, já que nestas coisas do andar do tempo os piores são sempre os que estão para vir.

(Tjeerd Royaards, http://www.cartoonmovement.com)