(Apesar das economias
avançadas e emergentes não se encontrarem propriamente numa estagnação de
crescimento, tem aumentado o número de macroeconomistas que começam a pensar em
torno de um problema de deficiência de procura, o que põe bem a claro a ausência de uma
explicação estabilizada e robusta para o que podemos designar de fraca recuperação…)
É verdade que várias sedes de prospetiva económica têm-se comprometido com
perspetivas de crescimento económico que só uma mente muito distraída pode
associar a uma situação de estagnação económica a curto prazo (não confundir
com dimensão mais estrutural e de longo prazo da estagnação secular).
Por isso, não deixa de ser algo de paradoxal e intrigante o aumento do número
de macroeconomistas, alguns de grande reputação, que têm começado a trabalhar
com a hipótese sugerida pelos dados disponíveis de que estaremos a viver uma deficiência
de procura, com o consumo e o investimento a crescerem a ritmos bem
incipientes. Ainda muito recentemente, Simon Wren-Lewis dá conta no seu Mainly Macro da honestidade que os economistas
devem manifestar reconhecendo que não têm formulada uma explicação cabal para a
pobre recuperação que, por exemplo, a economia britânica está a atravessar, visível
(ver gráfico de abertura) no abaixamento da economia britânica face ao comportamento
da tendência. No mesmo tom, o conhecidíssimo Olivier Blanchard num curto vídeo acolhido pelo VOX, portal do CEPR fala de expectativas autoalimentadas rebaixando
o crescimento da procura interna (consumo e investimento).
Parece não ser necessário andar a trabalhar para sábio para compreender que
vivemos períodos de propensão elevada à formação de expectativas que antecipam
o futuro com nuvens escuras. O contexto em que vive presentemente a geringonça à
portuguesa está nitidamente em contraciclo com tais nuvens, já que o índice de
confiança dos portugueses não para de aumentar, para desespero dos profetas do
descalabro. Mas a situação política nos EUA e a corrida de obstáculos que
começa na Europa por estes dias com as sucessivas eleições legislativas é
perfeitamente compatível com a formação de expectativas pessimistas que se
autoalimentem no sentido de antecipar perspetivas pobres de crescimento. Não é fácil
a consumidores e a empresas antecipar com rigor se o produto da economia está
ou não próximo do seu valor de tendência e com perspetivas pessimistas os próprios
trabalhadores desempregados podem antecipar entrar no mercado com salários mais
baixos ou simplesmente desaparecer da força de trabalho que procura um emprego.
Uma situação desta natureza obriga os economistas a tirar do armário uma teoria
do investimento que muitos julgaram ter enterrado, o chamado princípio do
acelerador do investimento, que Keynes nunca formalizou mas que discípulos seus
o fizeram. O acelerador do investimento diz-nos que a variação do investimento (versão mais pura) ou o próprio investimento (versão mais lata) realizado pelas
empresas num certo período depende da antecipação do comportamento da variação
da procura nos mercados em que se insere. Se um aumento de procura for antecipado
a variação do investimento é positiva. Se, pelo contrário, for prevista uma variação
negativa da procura o investimento reage no sentido contrário, podendo a sua variação ser nula ou negativa. O acelerador amplifica significativamente um clima de expectativas
pessimistas. Com o investimento privado a não disparar em tempos de taxas de
juro de saldo, isso significa alguma coisa. Já para não falar da fábula que nos
contaram que a confiança regressaria aos mercados se os governos consolidassem
quanto mais abrupta e rapidamente as contas públicas. Também não é preciso a
andar a trabalhar para sábio para concluir que as políticas de austeridade reforçaram
as expectativas pessimistas de variação da procura.
O acelerador não é seguramente uma teoria global e definitiva do
investimento. Mas conviria que os mais renitentes a tirassem do armário. É que
em tempos de pessimismo autoalimentado como nos fala Blanchard, ele retoma o
seu peso. Dá um certo gozo que na FEP fomos dos últimos moicanos a continuar a
ensinar o princípio da aceleração do investimento. Talvez alguns alunos passados
agora o entendam melhor.
(Correções introduzidas no terceiro parágrafo relativas às variantes de formalização do acelerador, 04.03.2017, às 09.10).
(Correções introduzidas no terceiro parágrafo relativas às variantes de formalização do acelerador, 04.03.2017, às 09.10).
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