quarta-feira, 15 de março de 2017

ALTERAÇÃO DE RELAÇÃO DE FORÇAS




(O trabalho de Thomas Piketty e dos economistas que com ele têm explorado a matéria da distribuição do rendimento e da riqueza continua a proporcionar à nossa reflexão números interessantes para compreender a mudança radical das relações entre o público e o privado, neste caso com valores do capital público e do capital privado…)

Thomas Piketty e outros economistas que com ele trabalham a WID.world, como Emmanuel Saez e Gabriel Zucman, entre outros, continuam a divulgar números ilustrativos do grande alcance que o seu trabalho veicula em matéria do estudo do capitalismo de hoje, designadamente acerca do choque de frente que vai ocorrendo entre o público e o privado.

Piketty, no seu blogue no Le Monde, tem sido sistemático, trazendo-nos números sobre variáveis que não nos são desconhecidas mas, regra geral, dificilmente as quantificamos. É esse o caso dos conceitos de capital público e capital privado. O conceito de capital é medido pela diferença entre a totalidade dos ativos possuídos quer pelo Estado quer pelo setor privado e a dívida desses setores num dado momento do tempo. É, assim, possível acompanhar a evolução temporal de capital e dívida em percentagem por exemplo do PIB ou do rendimento nacional. Piketty chama a atenção para a profunda inversão que se tem verificado no comportamento ao longo do tempo destas variáveis desde os tempos do crescimento de ouro que tornaram possível o crescimento sa social-democacia europeia até aos nossos dias. Ou seja, de um período de um elevado peso dos ativos públicos no rendimento e de baixo peso da dívida pública caminhamos vertiginosamente para o inverso. O capital público líquido (ativos menos dívida) é já negativo nas três principais economias avançadas, EUA, Japão e Reino Unido. Isto quer dizer que a dívida pública desses países não é totalmente ressarcida a partir dos ativos existentes nesses países.

O gráfico que abre este post descreve com clareza a descida do peso da propriedade pública (riqueza pública em percentagem da riqueza nacional) de 1978 a 2014, com destaque, não se espantem, com o observado na “comunista” China. A grande novidade do trabalho de Piketty e de seus colegas é terem introduzido o diálogo entre fluxos (a desigualdade na distribuição do rendimento) e stocks (capital e riqueza), materializando estas últimas o resultado da acumulação de desigualdades na distribuição do rendimento, a subida vertiginosa dos preços do imobiliário orientado para os 1% da população, a acumulação de poupança determinada pelo envelhecimento, os fenómenos das privatizações e a especulação financeira.

A relação de forças entre o público e o privado inverteu-se, marcando os tempos de hoje. Estamos assim a assistir segundo Piketty a grandes alterações na estrutura da propriedade, colocando as políticas redistributivas no coração do debate das alternativas políticas.

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