(O trabalho de Thomas
Piketty e dos economistas que com ele têm explorado a matéria da distribuição do
rendimento e da riqueza continua a proporcionar à nossa reflexão números interessantes
para compreender a mudança radical das relações entre o público e o privado, neste caso com valores do capital público e
do capital privado…)
Thomas Piketty e outros economistas que com ele trabalham a WID.world, como
Emmanuel Saez e Gabriel Zucman, entre outros, continuam a divulgar números ilustrativos
do grande alcance que o seu trabalho veicula em matéria do estudo do
capitalismo de hoje, designadamente acerca do choque de frente que vai ocorrendo
entre o público e o privado.
Piketty, no seu blogue no Le Monde, tem sido sistemático, trazendo-nos números
sobre variáveis que não nos são desconhecidas mas, regra geral, dificilmente as
quantificamos. É esse o caso dos conceitos de capital público e capital privado.
O conceito de capital é medido pela diferença entre a totalidade dos ativos possuídos
quer pelo Estado quer pelo setor privado e a dívida desses setores num dado
momento do tempo. É, assim, possível acompanhar a evolução temporal de capital
e dívida em percentagem por exemplo do PIB ou do rendimento nacional. Piketty
chama a atenção para a profunda inversão que se tem verificado no comportamento
ao longo do tempo destas variáveis desde os tempos do crescimento de ouro que tornaram
possível o crescimento sa social-democacia europeia até aos nossos dias. Ou
seja, de um período de um elevado peso dos ativos públicos no rendimento e de
baixo peso da dívida pública caminhamos vertiginosamente para o inverso. O
capital público líquido (ativos menos dívida) é já negativo nas três principais
economias avançadas, EUA, Japão e Reino Unido. Isto quer dizer que a dívida pública
desses países não é totalmente ressarcida a partir dos ativos existentes nesses
países.
O gráfico que abre este post descreve com clareza a descida do peso da
propriedade pública (riqueza pública em percentagem da riqueza nacional) de
1978 a 2014, com destaque, não se espantem, com o observado na “comunista”
China. A grande novidade do trabalho de Piketty e de seus colegas é terem introduzido
o diálogo entre fluxos (a desigualdade na distribuição do rendimento) e stocks (capital e riqueza), materializando
estas últimas o resultado da acumulação de desigualdades na distribuição do
rendimento, a subida vertiginosa dos preços do imobiliário orientado para os 1%
da população, a acumulação de poupança determinada pelo envelhecimento, os fenómenos
das privatizações e a especulação financeira.
A relação de forças entre o público e o privado inverteu-se, marcando os
tempos de hoje. Estamos assim a assistir segundo Piketty a grandes alterações
na estrutura da propriedade, colocando as políticas redistributivas no coração
do debate das alternativas políticas.
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