quarta-feira, 22 de março de 2017

PRECONCEBIMENTOS

(José Manuel Esteban, http://www.larazon.es)

Quase todos os dias ouço referências na TSF a um nome que assim se me foi tornando familiar, até pela sua estranheza, o de Mésicles Helin. E se aos Sábados ele surge frequentemente na qualidade de sonoplasta em reportagens de diverso tipo ou enquanto produtor dos “Encontros com o Património”, nos dias úteis em que se acorda mais cedo ele aparece como um desafiador das reflexões de Margarida Cordo e Vítor Cotovio numa rubrica de três minutos designada “Pensamento Cruzado”.

No último programa que se me deparou falava-se de narcisismo, de algum modo a pretexto de Donald Trump. A psicóloga pronunciava-se deste modo: “É uma pessoa que tem de ser o centro das atenções, que não sabe lidar com o insucesso, que não tem crítica para avaliar os próprios comportamentos, que tende a atribuir aos outros a responsabilidade e eventualmente as consequências dos erros que comete e por ter muito pouca crítica para avaliar o seu comportamento e, por ter esta necessidade de ser o centro e de ser valorizada e de ser aplaudida, pode tornar-se... Apesar de que no contacto pode ser uma pessoa muito sedutora e pode ser uma pessoa muito agradável ao trato com outros, mas isto é completamente superficial, ou seja, o único benefício que pretende alcançar é a confirmação do seu ser e do seu estar com o outro, ter que ser especial, ter que ser especialmente valorizado, não ser capaz de aceitar as suas próprias derrotas nem sequer de as reconhecer e, portanto, alguém com quem o convívio próximo é muito difícil a não ser que os conviventes sejam pessoas que existem para de alguma forma reforçar a sua postura, reforçar o seu ser, reforçar o seu estar e reforçar no fundo esta coisa do narcisismo olhando para dentro de si mesmo sem medir as consequências da sua ação na interação com os outros.” Ao que, e por outro lado, o médico psiquiatra juntava: “Dando continuidade ao que a Margarida estava a dizer, e pegando na última parte que é aquela que falava daquilo que o narcísico espera dos outros – é que estejam sempre de acordo com ele e tolera de facto muito mal quando não estão de acordo com ele, porque as pessoas existem para o reforçar no seu narcisismo e muitas vezes, de uma forma mais profunda, para compensar a sua insegurança, que está camuflada por aquela capa mais arrogante, mais provocadora e que se traduz em coisas que nós vamos vendo e que fazem parte da personalidade narcísica, aquilo que se falava deste encanto, deste encanto superficial mas manipulador. Por outro lado, esta incapacidade verdadeira de empatia – é uma pessoa que pode representar a empatia mas não sentir empaticamente, mas pode ter a capacidade de representar e, como tal, representa risco. Porquê? Porque a pessoa pode fazer mal fingindo que está a fazer o bem. E, portanto, todas estas caraterísticas são caraterísticas que depois, associadas àquilo que é o poder, aquilo que é estar sentado nos seus interesses, aquilo que é uma amoralidade – um autor das nossas áreas, o Otto Kernberg falava destas questões das personalidades narcísicas e muitas vezes ia das personalidades narcísicas mais benignas, porque para a nossa autoestima faz sentido ter algum narcisismo mais benigno; o problema é quando começamos a caminhar para aquilo que é a malignidade e para esta falta de discernimento e de autocrítica e então aí passamos pelo narcisismo maligno e aproximamo-nos daquilo que são registos mais psicopáticos no limite, onde a culpa nem existe para aquilo que possam ser atitudes desadequadas e perigosas em termos éticos.”

Não sei muito bem porquê – embora tenha mais do que vagas suspeitas... – mas a realidade é que dei comigo a pensar com quanta dose e variedade de narcisismo tenho vindo a ser atropelado ao longo do meu último ano de vida. De facto, e mesmo já não sendo um jovem incauto, é com enorme surpresa pessoal que assim tem sido em tantos e tantos casos e planos (alguns doentiamente lamentáveis). Será porque pensava, com uma talvez intolerável inocência, que conhecia melhor os meus semelhantes ou será porque há lugares e posições de onde se veem coisas que de outro modo nos tendem a escapar?

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