domingo, 26 de março de 2017

AGUSTINA

(Ricardo Soares para a Sábado)



(Quis a álea da vida que a doença impedisse Agustina Bessa Luís de continuar a escrever, por isso temos de nos contentar com o que temos, quase tudo, na estante e esperar que a arca da família esteja organizada, assim parece …)

Os últimos dias foram dias contraditórios em torno do nome e da obra de Agustina Bessa Luís, que povoa abundantemente as estantes de Seixas, já que o espaço de proximidade já não o permite.

Primeiro, a polémica entre a família e a Leya de Álvaro Sobrinho e de Paulo Teixeira Pinto (mas que raio de sociedade), que a Sábado documentou, não é digna da pena de Agustina. Uma obra como a sua e o seu talento de representação dos ambientes e atmosferas da burguesia portuense não mereciam estar envolvidos em questões de “mercearia” editorial. A editora lamenta-se da quebra de procura, o que não é para mim surpresa, a partir do momento em que não vejo gente nova a penetrar no universo de Agustina.

Mas da arca da família e do esforço da sua neta Lourença Baldaque e do patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian saíram recentemente os fabulosos três volumes dos ensaios e artigos que Agustina foi publicando por jornais e revistas de 1951 a 2007, num conjunto completo de noventa euros de preço base. É de uma torrente de pensamento e de argúcia e subtileza de pensamento que não tem paralelo na literatura portuguesa contemporânea que estamos a falar, mas que é fundamental para compreender o conteúdo dos seus romances.

Indisciplinado como sou comecei pelo volume mais recente.

De um artigo sobre teatro, Webster, Shakespeare e outras:

A indiferença é uma hostilidade sem heroísmo, mas hostilidade à mesma”. (volume 3,p. 1859).

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