(Reflexões soltas
sobre as eleições holandesas, nas quais a extrema-direita de Wilders parece ter
sido travada, mas onde outros traços emergem, aconselhando vigilância e persistência no
combate…)
A Holanda e a Europa respiraram de alívio. O conflito dos últimos dias com a
Turquia parece não ter tido qualquer influência na radicalização e, a ter tido influência,
ela aconteceu com uma espécie de regresso à razão, por muito que custe ao escritor
Rentes de Carvalho. As instituições europeias, embora à deriva, esperam que uma
nova sequência de acontecimentos tenha lugar e que ela contribua para suster a
Frente Nacional nas suas ambições.
É assim tempo para respirar fundo. Mas isso não significa que as eleições
holandesas não tragam novas reflexões e que devam ser tidas em conta na discussão
das vias políticas para acantonar os impulsos do radicalismo populista e controlar
todos os fatores e condições que forneçam combustível a essas tendências.
Em primeiro lugar, é bom que se tenha em conta que o partido de Wilders não
foi afastado da cena política. Foi contido, mas não erradicado. Ele está lá. Se
Rentes de Carvalho tiver razão, isto é, se Wilders tem coragem de expressar o
que outros não fazem por vergonha ou taticismo, então a sua ação política não
pode ser perdida de vista.
Depois, há o chamado efeito reflexo. Uma força política com 20 deputados (13%
dos votos) no Parlamento não pode deixar de ter influência no comportamento
defensivo das restantes forças políticas. Este é em meu entender o principal perigo
do populismo emergente. Uma grande parte das forças políticas tenderá a endogeneizar
no seu discurso preocupações securitárias marcando à zona as forças populistas propriamente
ditas. Veja-se, por exemplo, o que seria a candidatura de Fillon se não fosse
apanhada em contramão pelas tentações do vil metal e do favorecimento dos seus.
A grande interrogação na Holanda vai ser o de medir a dimensão deste efeito reflexo
na direita holandesa, que vai ter de gerir com o atual primeiro-ministro a nova
solução de governo.
Em terceiro lugar, as eleições holandesas confirmam a DeC (Derrocada em
Curso) do socialismo europeu, qualquer que seja a sua orientação e com a exceção
do PS em Portugal. Os trabalhistas de Jeroen Dijsselbloem, presidente do Eurogrupo
afundam-se no resultado eleitoral, contribuindo para a queda vertiginosa de votos
observada na coligação no poder. Não é surpresa, mas simplesmente a confirmação
de algo de mais estrutural está em curso e, por muito que nos custe, a nossa
pequena dimensão não conta, embora possa ser olhada com interesse e curiosidade.
Finalmente, confirma-se a ideia vinda de outras paragens, que a derrocada
em curso do socialismo europeu, atamancado, travestido ou até genuíno, se
concretiza com perdas em duas direções: à sua esquerda, para forças mais jovens
e irreverentes, como parecer ser o caso da Holanda em que os Verdes (Esquerda
Verde e os 30 anos do seu líder) quadruplicaram o número de deputados; à sua
direita, para o populismo mais ou menos radical.
As tulipas podem florescer mais sossegadas. Mas irão fazê-lo num contexto
de profunda mudança que só não vê quem não quer ver.
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