(Vai pelo burgo
uma grande agitação sobre as pretensas obrigações de um banco público e, embora
desconheça na prática o mandato que foi colocado em cima dos ombros da nova
administração da CGD, não é
difícil chegar à conclusão de que campeia a mais completa desorientação entre
as hostes políticas quanto ao papel da banca pública, aconselhando por isso …)
A maneira canhestra e incompetente com que as forças políticas
representadas a nível parlamentar tendem a influenciar a opinião pública quanto
às obrigações a impor à Caixa Geral de Depósitos fazem emergir a ideia de que o
dinheiro público a cobrar através de impostos estará tanto mais defendido quanto
menos interferência houver dessas forças junto da Administração da Caixa.
A asneira subiu de tom quando se formou a ideia recente de que a CGD
estaria obrigada a uma espécie de serviço público de cobertura da mais ínfima
parcela do território nacional. Tudo como se a banca fizesse parte desse serviço
público e ainda mais espantoso como se não houvesse toda uma outra máquina de
administração pública que o governo tem à sua disposição para manter a sua presença
pelo território. Mais ainda como se o Estado estivesse imune a más práticas
nessa matéria, sobretudo pela forma territorialmente desintegrada e vertical
como organiza a sua eficiência no território, precipitando ele próprio o
abandono dos territórios, condenando-os à agonia da não proximidade face aos
cidadãos residentes. Ou ainda como se não conhecêssemos as vicissitudes da
criada Unidade de Missão para a Valorização do Interior, mendigando (sem ofensa
para a Professora Helena de Freitas) em cada ministério uns euros para forjar
um pacote coerente de medidas de intervenção. Por isso, é particularmente “comovente”
ver como as forças políticas choram como Madalenas as dificuldades que a reestruturação
da CGD colocará a esses territórios, quando são cúmplices de anos e anos de inação
quanto a esta matéria.
Por outro lado, toda a gente carpiu as suas acusações contra a insensibilidade
territorial da reestruturação da Caixa, não prestando a mínima atenção ao
estado lastimoso em que a instituição foi colocada, claro que também pela crise
de 2007-2008, mas muito e fundamentalmente por decisões que continham em si
mesmas a marca de água inconfundível da imparidade, alimentando um modelo de
crescimento económico que estava condenado à exaustão. Ou seja, como se a recapitalização
fosse um processo que atuasse a partir do zero, sem constrangimentos, onde não
tivéssemos que contornar as exigências da burocracia das ajudas de estado e
outras que tais.
Noutro plano, sobretudo à esquerda, o banco público é interpretado como uma
entidade que atuará num mercado inexistente, como se estivesse sozinho e não
tivesse de enfrentar estratégias de concorrentes poderosos, particularmente
ligados ao sistema financeiro espanhol e, em menor medida, caso do BCP, ao chinês.
Por vezes, surge a ideia de que existe uma correlação forte entre existência de
um banco público, solidez financeira e desenvolvimento do país (Jorge Coelho
tem sido autor na Quadratura desta posição), sem que se compreenda o fundamento
de tal argumento. À direita, por mais estratégia defensiva que coloquem nos
argumentos, à medida que falam e situam as suas razões mais ficamos convencidos
que não têm a coragem política para pedir a privatização da entidade.
É por isso neste contexto fundamental discutir o que é que estas almas pensam
dever ser um banco público.
Aqui vão algumas ideias possíveis para ajudar a limpar o ruído que tem por
aí proliferado.
Em primeiro lugar, a partir do momento em que a ideia do Banco de Fomento
foi completamente abordada e que a economia portuguesa não tem uma oferta de crédito
a longo prazo compatível com os desafios que enfrenta. Assim, poderá
discutir-se em que medida a CGD poderá ser orientada para esse desígnio,
constituindo-se em centro racionalizador de financiamento a médio e longo prazo
na economia portuguesa. Mas não é líquido que a economia portuguesa constitua mercado
credível para esse alinhamento de desígnio.
Depois, o banco público tem um papel a desempenhar na moralização das decisões
de crédito, contribuindo para afastar do sistema a procura insolvente e não
capaz de desenvolver projetos de retorno seguro e aqui muito terá que
contrariar administrações anteriores, sobretudo as que se deixaram embalar pela
tentação dos não transacionáveis.
Mais ainda, há sempre o foco possível do crédito à internacionalização e à
exportação, apoiando a mudança estrutural na afetação de recursos na economia
portuguesa de que tanto necessitamos para uma maior sustentabilidade do crescimento.
Não esqueçamos também o papel possível de articulação saudável e racionalizadora
entre a oferta de poupança decorrente da diáspora e a sua canalização para o
investimento, sem falsos eldorados de taxas super, super.
E, por fim, dada a sua quota de mercado, o banco público pode contribuir para
o alinhamento de posições estabilizadoras no mercado, impondo referenciais para
os restantes players.
Matéria não falta. A minha dúvida não andará por aí. Andará mais pelo peso
de constrangimento que a situação de partida tenderá a impor ao banco público,
apesar da recapitalização.
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