(Circula por aí a
ideia de que o futuro da União pode estar dependente de dois nomes que vão
jogar a sua sorte em eleições próximas, o que em meu entender evidencia bem o estado de desespero a que o
futuro Europeu chegou …)
A prestação de Emmanuel Macron e de Martin Schulz nas eleições francesas e
alemãs que se avizinham não será seguramente indiferente em primeiro lugar ao
futuro daqueles países.
Macron terá percebido, inteligência a sua, quão próximo estava o precipício
de que o governo de Hollande rapidamente se abeirava, saltou atempadamente fora
e, no meio de tanto nepotismo de fraca dimensão, aparece com o seu centrismo
como o possível salvador da pátria, embora com vida que estará longe de ser fácil.
A sua eventual eleição, mais provavelmente em segunda volta de maio do que em
primeira de abril, para além de suster a ferocidade loira de Marine Le Pen,
tenderá a provocar outras consequências. Mostrará que a eleição de Hollande foi
uma espécie de últimas vontades do socialismo francês, que tenderá a hibernar
durante algum tempo, para recompor gorduras, tão escanzelado ele se encontra. Provocará
uma grande confusão na direita francesa que se vê obrigada a suportar o
nepotismo de baixa estirpe de Fillon, já que Juppé não está para aí virado e o
efeito Sarkozy deixou marcas que a direita não quer repetir. O cenário de ganho
das Presidenciais por Macron é algo estranho pois o eventual novo Presidente não
tem força partidária própria com quem interagir e vai mesmo ter de fugir à retórica
do Presidente de todos os franceses. Não terá vida fácil e é irónico que algum
do pensamento que vê nele uma solução para o relançamento europeu (como Wolfgang Münchau) se apresse a dizer que receia que o eventual novo Presidente
não resista a um mar algo mais encapelado.
Quanto a Schulz espera-se dele não propriamente a vitória nas eleições alemãs
mas sim a chance de proporcionar ao SPD uma votação que lhe permita sonhar com
uma geringonça à alemã, ou então uma coligação mais equilibrada com a senhora
Merkel que permita libertar o governo alemão e o Eurogrupo da presença do ministro
Schäuble, não necessariamente do pensamento alemão mais profundo sobre os
destinos da União.
Demos de barato que a primeira previsão se concretiza, Macron ao poder sem
partido na Assembleia e no Senado, e que a segunda coloca Schulz com algum
poder de revigoramento do SPD, mais provável a primeira do que a segunda. Neste
suposto cenário, que tipo de eixo franco-alemão sairia desta reviravolta
eleitoral parcial?
Não estou tão otimista quanto Münchau sobre os auspiciosos efeitos deste
desejado refrescamento eleitoral sobre a clarificação dos destinos europeus. Em
post anterior, procurei mostrar que o
problema europeu está na dificuldade de, a partir das bases políticas nacionais
existentes e do modo como as instituições europeias, parte da Comissão e seguramente
o Eurogrupo, acolheram pensamento que se enraizou, ser possível gerar uma solução
de aprofundamento democratizante da União. A captura das instituições europeias
por pensamento económico e político unificado torna essas instituições frágeis
para se opor à solução de desenho do futuro europeu com base no Conselho (nas
capitais nacionais), nos parlamentos nacionais e algumas cedências ao Parlamento
Europeu, ele próprio refém da falta de clarificação política diferenciadora. O
espirito de Jean Monnet de grande esperança na força transformadora das
instituições europeias parece comprometido pela captura de que as mesmas foram
objeto, incapazes por isso de assegurar a mudança democrática. Isto explica que
possa subscrever, não obviamente pelos mesmos motivos, as críticas que uma Le Pen
faz a tais instituições.
O Economist dedicou na sua edição
da passada sexta-feira um longo e fundamentado survey sobre a União Europeia e suas derivas e encruzilhadas nas vésperas
do Reino Unido acionar o artigo 50º. Vale a pena lê-lo, embora se saia da sua leitura
quase com a convicção de que a flexibilidade da União a diferentes velocidades
vai constituir a saída inevitável. O Economist avança com vários argumentos
para fundamentar a sua posição. É matéria para outros posts. Mas houve um que
me despertou mais a atenção. A Europa é já um comboio estranho em que as carruagens
circulam a diferentes velocidades e a máquina corre por interesse próprio: a
Europa da União (a vinte e oito), a Europa do Euro (a dezoito), a Nato (a vinte
e oito), a Europa de Schengen (a vinte e seis), a Europa da EEA (a trinta e um
com a Croácia como membro provisório) e a Europa da União Aduaneira (a trinta e
dois). Elementar meu caro Watson!
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