terça-feira, 28 de março de 2017

AINDA A QUESTÃO DA PRODUTIVIDADE




(A desaceleração do crescimento da produtividade nas principais economias avançadas, medida quer pela produtividade aparente do trabalho, quer pela produtividade global dos fatores, continua a intrigar os economistas; o tema tem interessado este blogue e hoje aqui fica uma ótica diferente para a sua explicação …)

Este blogue tem dado a devida atenção a este facto estilizado do crescimento mais recente. A degradação dinâmica da produtividade coexiste com uma recuperação das economias que está longe de poder ser considerada satisfatória. Coexiste também, sobretudo nos EUA, mas também no Reino Unido, com reduções consideráveis da taxa de desemprego, a ponto de alguns economistas falarem a propósito da economia americana de “quase pleno emprego”, facto que torna ainda mais estranha a audiência popular das teses económicas de Trump.

As perspetivas de debate que temos trazido até a este espaço são praticamente todas de natureza macro, é de produtividade global que temos falado. É tempo de conceder espaço a explicações que colocam a dimensão micro e das empresas no radar do debate.

Os economistas da OCDE Dan Andrews, Chiara Criscuolo e Peter Gal trazem para o VOX EU ecos de investigação realizada nos gabinetes da OCDE pela qual trazem para a explicação da degradação da produtividade aspetos micro.

Os três economistas introduzem no debate dois elementos de valia explicativa a que não podemos ficar indiferentes. Por um lado, chamam a atenção para a crescente heterogeneidade dos níveis de crescimento da produtividade entre as empresas dos países OCDE. Por outro, sugerem estar a acontecer um intenso processo de destruição criadora, expulsando da atividade empresas com menor desempenho e introduzindo no sistema empresas mais eficientes, o que gera um intenso processo de afetação de recursos em direção a atividades mais produtivas.

Na análise dos três economistas destaca-se o tratamento dos gaps que estão a cavar-se entre as empresas de fronteira (as que apresentam níveis de produtividade mais elevados, mais propriamente os 5% de empresas com as produtividades mais elevadas) e as empresas vassoura (as que apresentam as produtividades mais baixas e estão sistematicamente em risco de ser expulsas do mercado), por simplificação todas as restantes. As diferenças de ritmos de crescimento da produtividade para estes dois grupos de empresas (numa base harmonizada de empresas de 24 países OCDE) são assinaláveis, cerca de 1 para 4 ou 5 (2,8% nas empresas fronteira e 0,6% nas restantes). Este gap pode sugerir que a questão da degradação dinâmica da produtividade não seja explicada pelo caráter mais lento do ritmo tecnológico na fronteira (como é sugerido pelas teses de Robert Gordon, já aqui analisadas em devido tempo, ver post de 3 de agosto), mas antes pelos padrões de heterogeneidade no universo empresarial e pelo agravamento das desigualdades de desempenho empresarial. O que é relevante assinalar é que nas análises dos três economistas a explicação parece subsistir mesmo quando se introduz na explicação os graus de intensidade em capital dos setores e das empresas e as margens mais elevadas que as empresas de fronteira podem estabelecer na fixação dos seus preços.

Mas uma explicação cabal deste desempenho diferenciado exige a ponderação das causas que explicam o maior crescimento da produtividade nas empresas de fronteira, caso contrário estaríamos perante uma tautologia, ou seja, fronteira = maior crescimento da produtividade. Nesse aspeto, o trabalho dos três economistas ainda tem algum pão duro para roer. Uma hipótese será a possibilidade das empresas de fronteira estarem a concentrar os benefícios da economia digital e de outras manifestações da tecnologia mais moderna. Mas esta hipótese parece contrariar o princípio da difusão da inovação tecnológica, ou seja, porque razão ao contrário de outras épocas não se opera a difusão a partir das empresas que ocupam a fronteira tecnológica. Os autores invocam com especial incidência nos serviços de tecnologias de informação e comunicação o efeito “The winner takes all the dynamics”, ou seja, algo de semelhante ao “eles comem tudo” aplicado à tecnologia. Mesmo assim, não se entende por que razão os que não estão na fronteira não são incentivados a utilizar as mesmas tecnologias. Questões de concentração empresarial excessiva, decorrente por exemplo dos elevados investimentos em I&D só acessíveis aos grandes?

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