(A questão dos
excedentes correntes externos é uma das tais questões em que o senso comum e a
teoria económica divergem frequentemente, mas o pior é que essa divergência também
acontece entre a ação política e a teoria económica, como aliás a análise do problema à escala
mundial bem o evidencia…)
Embora a opinião pública e o senso comum não saibam o que foi o mercantilismo
económico, a verdade é que a ideia de que os países devem prosseguir excedentes
comerciais externos (da chamada balança corrente) é regra geral aceite pelo
senso comum como uma boa política. No quadro de uma economia mundial equilibrada
e sem guerras comerciais, a procura de sistemáticos excedentes da balança
corrente equivale a uma ameaça de guerra comercial. A economia mundial está
equilibrada como um todo, mas quando se declina esse equilíbrio global há regiões
excedentárias e outras deficitárias, aliás a condição para que o saldo corrente
do mundo esteja equilibrado. O problema não está em haver regiões excedentárias
e deficitárias. O problema está em não haver alternância dessas posições. Entre
outras razões, não pode ignorar-se que há economias em que o crescimento mais acelerado
exige défices virtuosos, os que são devidos a incrementos de importação de
equipamentos.
A economia mundial começa a revelar sinais de alguma rigidez na alternância
de situações excedentárias e deficitárias. Assim, à posição deficitária essencialmente
dos EUA, mas também do Reino Unido, embora em menor magnitude, tem
correspondido a intensificação da posição excedentária do Japão (em aceleração),
da China (em desaceleração) e da Alemanha (em aceleração). É particularmente
relevante o crescimento do Japão e da Alemanha. Mas o Japão não está inserido
em nenhuma lógica de união económica e monetária, ao passo que a Alemanha é o
motor da zona Euro. O que é espantoso é que o excedente da balança corrente da
China (previsão FMI para 2017 de 200.000 milhões de dólares é inferior ao
excedente da balança corrente da Alemanha (previsão para 2017 de 291.700 milhões
de dólares). Ponderando esses excedentes pela dimensão do país, rapidamente se
chega à conclusão da dupla anomalia do excedente alemão, pelo facto de
pertencer a uma união económica e monetária e pela sua desproporção face à
dimensão do país).
Por isso, anotei o facto de ser significativamente mais grave a divergência
entre a ação política alemã e a teoria económica do que quando ela acontece
entre esta e o senso comum. Dito de outra maneira, quando se está inserido numa
lógica de equilíbrios mundiais e sub-regionais, a simples pertença a esses contextos
impõe limites ao comportamento dos agentes económicos e dos decisores políticos.
Ou seja, ou os alemães começam a poupar menos ou pelo menos o investimento designadamente
público tem de transformar recursos de poupança em investimento, sob pena de isso
representar face aos seus congéneres da zona euro algo de inaceitável. Curiosamente,
Trump e seus conselheiros já apontaram baterias para a insustentável posição
alemã. Mas é no campo da zona euro que a penalização se faz mais sentir porque prejudica
seriamente os esforços dos menos desenvolvidos para exportar, crescer e responder
ao serviço da dívida.
Timothy Taylor, no Conversable Economist, tem uma boa intuição desse problema e da fonte de animosidade mundial que pode
suscitar.
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