(Independentemente de saber se as investigações judiciais
em curso em torno do assessor jurídico do SLB conduzirão ou não a evidências-crime,
o que está a hoje a desenrolar-se pelas bandas da Luz, juntamente com a antecâmara
deste processo, constitui uma mancha irreversível em dois planos: no da memória
do clube e na imagem de modernidade organizativa que parecia desenhar-se em
torno da SAD. A águia vitória estará desorientada, assim como o
estarão nomes incontornáveis da história do SLB.
O futebol transformou-se
em Portugal num raro espaço de observação do universo nebuloso das relações entre
o público e o privado. Por isso, não pode estar fora deste blogue. Considerando-me
eu um espectador racional, dos que gosta de sofrer sozinho, que gosta de interpretar
o futebol para lá da bola que entra ou não entra, a situação de paredes meias
com coisas feias, muito feias, em que o SLB se deixou envolver destrói consigo
muita coisa de valor que deveria ser intocável.
Sempre achei que Luís
Filipe Vieira não é boa peça e que faz parte de um conjunto de homens de negócios
do tipo “self-made man” em circunstâncias
que não são nada claras e que instrumentalizam o poder até for possível. LFV,
como muitos outros, são personagens de um mundo dos negócios, daqueles que
distorceram quanto baste a economia portuguesa e a alocação dos seus recursos públicos
e privados até à inviabilização do modelo de crescimento pela sua exaustão e “burning out” no plano do financiamento.
Fui dos que pensei que,
devido ao surto de profissionalização que o negócio das SAD obriga e sobretudo
devido a alguns nomes e profissionais desse universo, o SLB estivesse, para lá
das limitações e desvios do seu timoneiro, a entrar numa era de modernidade organizativa,
tal como o FCP atravessou em tempos. Como é óbvio, nunca fui ingénuo ao ponto
de admitir que essas forças de modernidade organizativa não chocassem com reminiscências
de baixo nível do modelo anterior, do poder pessoal, dos negócios mais obscuros.
Estas reminiscências têm nomes e abrangem uma multidão de pequenos artistas que circulam
em torno das lideranças, abrigados de testes de competência e profissionalismo
e seguros por pontas de interesses e ligações pessoais, que sabemos lá o que
escondem e como se fundamentam. Na minha interpretação, nos últimos tempos e pelo
menos do ponto de vista da apreciação de como a época de 2017-2018 foi preparada,
essa tensão entre a modernidade organizativa e o outro pequeno mundo começou a
pender para este último.
Se assim for, e trata-se
apenas de uma interpretação do que vou lendo e ouvindo, seria importante que a
organização sangrasse o suficiente, para permitir alguma regeneração. Parece um
harakiri de um adepto ingénuo e racional na interpretação das evidências, mas por
vezes só essas transições são possíveis. E se por acaso acontecessem outros sangramentos
noutras paragens poder-se-ia respirar melhor. No meio de tanto lodo, a figura do presidente da Federação
Portuguesa de Futebol arrisca-se a ser a figura da regeneração de todo este
universo que cambaleia com tantas contradições.
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