sexta-feira, 23 de março de 2018

EM FUGA OU EXILADOS?



(O impasse catalão está para durar. A decisão de Rajoy de repousar toda a pretensa solução do problema na perspetiva judicial, se bem que tenha matéria suficiente de irresponsabilidade independentista para fazer a sua via, equivale na prática a um impasse de bloqueio total da desejada normalização catalã. O não cruzamento da abordagem judicial com uma perspetiva política coloca o problema catalão em rota de descomando e de incerteza total)

Fiz parte do grupo de pessoas em Portugal que não se deixou enganar pelo independentismo catalão e sempre aqui denunciei a irresponsabilidade independentista, não pela ideia em si, mas sobretudo pela perspetiva manipuladora do sentimento independentista que os principais representantes do pós destruição da CiU de Pujol sempre evidenciaram. Num processo desta natureza, quando se acionam as alavancas de um processo anticonstitucional é para levar até ao fim e sobretudo não esperar que o poder estabelecido (ainda por cima o do PP, tão sensível aos símbolos e defesas do espanholismo mais profundo, admitisse de bom grado premiar a destruição dos princípios constitucionais e da unidade da Espanha.

Esta minha posição não significa ignorar dois aspetos fundamentais:

·        O sentimento independentista existe, está vivo, reproduz-se geracionalmente, mesmo que possamos duvidar dos fundamentos históricos que alguns invocam para o fundamentar;
·        Se não quisermos que o assunto desemboque em violência e gere fenómenos para-militares do tipo ETA ou suas transformações, o problema é essencialmente político, mesmo que os independentistas de hoje ao ultrapassarem os limites, mesmo que flexíveis da lei, se tenham posto a jeito para a via judicial.

Assim sendo, quando o PP coloca nas mãos de um juiz, Llarena de sua graça, a condução de todo o processo, lavando daí as suas mãos como um Pilatos dos tempos modernos, é de esperar claro está o cumprimento da lei e, com isso, o bloqueio político de todo o processo. A condução do processo judicial teria inevitavelmente que encontrar violações da legalidade na condução do processo que levou ao referendo e posteriormente ao acionamento do artigo 155º da Constituição. Temos por isso neste momento membros da Esquerda Republicana (o seu líder Oriol Junqueras) e das associações cívicas que dinamizaram o processo e o juiz Llarena decidiu estender essa prisão a outros elementos, conselheiros e não só, atingindo também o partido de Puigdemont.

Antecipando tal decisão, a decisão de tentar uma investidura de Turull também com ordem de detenção foi patética e nem sequer nas condições excecionais que ela revestiu foi possível reunir o número de votos adequados para conseguir a referida investidura. O independentismo sai por baixo mas também todo o regime democrático espanhol. E, agora que a vice da Esquerda Republicana Marta Rovira decidiu não prestar declarações no Supremo Tribunal e fugir para a Suiça, abre-se a velha questão de saber se estamos perante exilados ou simplesmente fugitivos à lei. A rotura dos independentistas mais radicais da CUP com todo o processo está declarada e neste momento nem sequer uma maioria política independentista capaz de assegurar uma investidura. A degradação irreversível da situação política catalã está consumada e não se entende o que é que a Espanha pode retirar de positivo deste bloqueio político. O PP desapareceu politicamente da Catalunha isso já o sabíamos e tínhamos antecipado. Mas a situação catalã arrisca-se a provocar uma reorganização do espectro político em Espanha de proporções não antecipáveis. Entretanto, o juiz Llarena conseguirá as suas condenações e até já conseguiu equiparar a manipulação da secessão ao golpe de 23 de fevereiro de 1981 do inenarrável coronel Tejero que sequestrou o Congresso. Mas que direção mais estranha em que toda a questão catalã está a evoluir?

A combinação explosiva da irresponsabilidade independentista e da falta de arcaboiço político tem tudo para ser trágica.

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