(A rocambolesca detenção de Puigdemont numa estação de
serviço alemã próxima da fronteira com a Dinamarca assinala praticamente o fim da
irreversível impossibilidade do processo catalão e não vai ser a violência das
ruas de Barcelona que demonstrará o contrário. Mas a evidência dessa
impossibilidade não significa o fim do impasse político em Espanha, longe disso.)
Não vou
entrar na discussão de saber se a detenção de Puigdemont se deve ou não a uma
errada avaliação das condições de segurança na viagem da Bélgica para a Finlândia
e volta. Nos últimos dias, pressentia-se que o líder independentista jogava na
elevada probabilidade de novas eleições, para as quais se preparava para de
novo fazer campanha à distância. Talvez não tivesse devidamente avaliado a possibilidade
do juiz Llarena emitir de novo o mandato de detenção a nível internacional,
facto que objetivamente lhe reduziria drasticamente a sua mobilidade em território
europeu, mesmo que explorando as diferenças legais entre os países quanto ao
delito em que Puigdemont está envolvido. A sua detenção numa prosaica estação de
serviço alemã, pouco depois de deixar território dinamarquês, põe fim a uma
representação desproporcionada e distorcida das margens de manobra do independentismo,
qualquer que seja a decisão das autoridades alemãs quanto à sua possível
extradição para Espanha.
Puigdemont
nunca se livrará da célebre afirmação que proferiu de que “entre ser presidente
ou presidiário preferia ser presidente”. Detido para interrogatório numa prisão
alemã, Puigdemont nunca escapará ao confronto com a contrária posição assumida
pelo líder da Esquerda Republicana Oriol Junqueras que, entre a fuga ou a detenção
em Espanha, preferiu esta última, fazendo passar para a justiça e governo espanhóis
o ónus de ter na prisão um líder independentista. Alguém truculento e impiedoso
como Xosé Luís Barreiro Rivas não o poderia ignorar (Voz de Galicia, aqui),
referindo-se à detenção de Puigdemont: “um vilão fugitivo,
caçado como um incauto e desprevenido, que contrasta com um homem de corpo
inteiro, como Junqueras, cujos evidentes erros e obcecadas convicções em nada o
rebaixam. Porque o tempo, como é conhecido, põe cada um no seu lugar”.
Há
personagens da história que estão condenadas a passagens desproporcionadas pelos
seus meandros. A pretensão de comparação com outros líderes catalães no exílio
de outros tempos como Companys (também ele detido por alemães, nazis de então,
e extraditado para Espanha para fuzilamento pelos franquistas) sempre soou a
exagero.
Paradoxalmente,
é este regresso à perceção da irreversível impossibilidade do processo catalão
que vai exacerbar ânimos, multiplicar a violência de rua e prolongar o irrealismo
dos seus líderes não presos, com expressão máxima no atual presidente do
parlamento recentemente eleito Roger Torrent. A sua declaração oficial e solene
após a detenção de Puigdemont é um monumento de prosápia sobre o pretenso poder
absoluto do presidente agora detido. Quer isto significar que o impasse catalão
continua e agora com a evidente articulação com o impasse político espanhol. O
tempo das coisas pertence agora ao juiz do Supremo Llarena e não se percebe
como é que o tempo da política poderá a curto prazo sobrepor-se ao da justiça.
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