O inesquecível
personagem de Lampedusa no Leopardo de Visconti dizia que era preciso que tudo
mudasse para ficar tudo na mesma. Rajoy não parece convencido dessa máxima de
vida e cultiva um imobilismo de outra natureza. Também espera não ter de mudar mas
constrói ele próprio uma visão imobilista do contexto em que se insere,
formando uma espécie de segunda realidade. Essa não era a perspetiva do
personagem do Lampedusa, mas os tempos são outros e temos de baixar padrões de
referência.
Todos sabem
que o PP de Rajoy está metido num grande lio. A questão catalã permitiu-lhe paradoxalmente
alguma imagem de autoridade quando acionou o artigo 155º da Constituição que ninguém
tinha ousado fazer e talvez por essa via tenha surpreendido os incautos e
desmiolados líderes independentistas catalães que cedo mostraram não ter unhas
para tamanha escalada. Mas ao entregar-se nas mãos da justiça, uma opção que
lhe assistia, ninguém o questiona, acabou por abdicar de uma solução política
que lhe garantisse retomar o controlo (político) da situação. Até porque entretanto,
à sua esquerda, o PSOE de Sánchez está entretido com divisões internas a ponto
de paralisar a sua intervenção nas Cortes Espanholas e o PODEMOS de Iglésias
também não navega em águas menos turvas. Nesse caso, mostrou garras demasiado
afiadas para o contexto político espanhol e aguarda por melhores dias. Mas o
problema é que Rajoy não contou que a questão catalã catapultasse Rivera e o
CIUDADANOS para uma alternativa de direita mais moderna e consequente. Neste
momento, o CIUDADANOS já não morde apenas os calcanhares. Já trepa, salvo seja,
pelas pernas acima do PP. E nestas andanças da política, com contactos com os meus
amigos espanhóis, sobretudo galegos, aprendi a olhar em primeiro lugar para a
movimentação da OPUS espanhola. É um excelente barómetro da direita espanhola,
sabem mais do que todos os Barcenas e personagens menores deste mundo que gravitam
no PP. E, decididamente, a OPUS não está confortável com este marasmo do PP, é
nefasto para a modernidade dos negócios e estes têm de ser olhados com
profissionalismo, doa às amizades que doerem.
Não tenho
conhecimento profundo sobre as personalidades que ladeiam politicamente Rajoy, sobretudo
as Señoras Santamaria e Cospedal, para avaliar com rigor se estará nesse campo de
mulheres que vão à luta a emergir uma alternativa interna a Rajoy que lhe ofereça
uma pausa gratificante e com algum prestígio. Mas sei que Alberto Nuñez Feijóo,
líder da Xunta de Galicia, aspira a qualquer coisa. E até sei que Feijóo e Santamaria
não escondem as suas inimizades essencialmente políticas. Feijóo tem um perfil
que ele julga suscetível de combate a Rivera e se calhar até tem razão.
Ora, ironia
das ironias, a síntese matinal do La Vanguardia que chega religiosamente ao meu
correio eletrónico publica hoje (link aqui) uma notícia que dá conta da multiplicação de
aparecimentos de Feijóo em tudo que é meio de comunicação com projeção nacional
em Espanha. Alguma coisa está no ar e se Rajoy constrói uma situação política em
que nada mexe há quem no interior do PP não pense assim e se movimente.
Não deixa de
ser também irónico que, depois de um ajustamento na economia e na sociedade
espanhola de grande dureza, por isso propício a mudanças políticas à esquerda,
a dinâmica que se anuncia acontece precisamente à direita. Sinal dos tempos de
agonia moribunda em que alguma esquerda europeia está mergulhada.
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