(Novos dados empíricos parecem
sugerir que nas duas últimas décadas algo de novo e mais promissor se terá
passado quando se compara o crescimento do produto per capita dos países menos
desenvolvidos em função da situação de partida do período em análise. A
questão que se coloca é se a aparente novidade das duas últimas décadas é
bastante para inverter a ideia alimentada no longo prazo de que em geral os países
menos desenvolvidos não estão a convergir com os mais desenvolvidos.)
Há matérias em economia que dependem irritantemente dos dados empíricos e
de cálculos mais ou menos sofisticados sobre esses mesmos dados para determinar
as evidências sobre as quais a teoria tem uma palavra a dizer. Essa dependência
obriga, entre outras coisas, não só a repetir cálculos com métodos cada vez
mais sofisticados para períodos diferentes, mas também e sobretudo a contextualizar
sempre as análises em função do período estudado e da amostra de países que for
considerada.
Um desses temas é indiscutivelmente o da convergência/divergência entre países
com níveis de desenvolvimento socioeconómico diferenciado. Sem entrar em
desenvolvimentos técnicos que transcendem o alcance deste blogue,
referir-nos-emos aqui aos temas da convergência/divergência incondicional e
condicional. O método utilizado é em grandes linhas de explicação o seguinte. Toma-se,
em primeiro lugar, um período para referência temporal. Admitamos o período de
1995 a 2015, duas décadas de crescimento económico. Define-se um universo de países
com níveis de desenvolvimento socioeconómico medido pelo produto per capita (temos o paradoxo de toda a
gente malhar no conceito mas ser o de utilização mais generalizada) o mais
diferenciado possível. Calcula-se o produto per
capita de cada país na situação de partida, neste caso 1995. Calculam-se as
taxas de crescimento anual médio do produto per capita no período considerado. Analisa-se
depois a equação linear y = a+βx em
que y representa o produto per
capita dos países em 1995 e x a taxa
de crescimento anual médio dos países no período em causa. Esta equação
representa o ajustamento linear à nuvem de pontos definidos pelos diferentes y
e x.
A estimação do valor de β determinará
a existência de uma situação de convergência ou de divergência em função do seu
sinal. Se for positivo, isso quererá dizer que quanto maior o rendimento per
capita de partida maior em média a taxa de crescimento. Diremos que se trata de
uma divergência incondicional ou absoluta: os mais ricos tenderão a ficar mais
ricos. Se, pelo contrário, β for negativo
isso quererá dizer que em média os mais desenvolvidos á partida crescerão menos,
ou seja uma situação de convergência incondicional ou absoluta.
A convergência/divergência condicional obriga a cálculos mais sofisticados,
pois obriga a controlar a relação entre taxa de crescimento e produto per capita de partida por outras variáveis
que influenciarão o produto per capitanas economias mais pobres.
Consideremos apenas as questões da convergência incondicional ou absoluta. Até
há bem pouco tempo, todos os universos conhecidos de países com níveis
diferenciados de desenvolvimento socioeconómico ofereciam evidências de divergência
absoluta. Pois nas duas últimas décadas, segundo um post recente de um conjunto
de economistas que escreve para o PIIE – Peterson Institute for International Economics (link aqui) o valor de β apresenta-se
negativo para três fontes principais de dados. Face aos períodos longos e
passados que tinham sido estudados até ao momento, não deixa de ser uma alteração
relevante de comportamento. Não sabemos porém se as evidências das duas últimas
décadas são suficientes para inverter o que historicamente o economista Lant
Pritchett no Journal of Economic Perspectives de 1997 designava por DIVERGENCE
BIG TIME. Há quem refira inclusivamente que uma medida simultaneamente
mais ampla e rigorosa das condições de partida que não simplesmente o produto
per capita poderia revelar conclusões bem menos otimistas. O coeficiente β apresentado nos cálculos dos três
economistas também não é muito negativo o que sugere um baixo nível de convergência.
Mas de qualquer modo uma vez mais se confirma a irritante dependência das questões
da convergência/divergência das evidências empíricas reunidas. É algo de inevitável.
Os períodos da economia mundial revelam diferenças sensíveis ao longo do tempo
que não só influenciam os ganhos potenciais dos países menos desenvolvidos,
como também a organização desses países para disso beneficiar pode se alterar
profundamente ao longo do tempo.
Certamente que estes novos dados vão dar origem a réplicas com novos
universos de referência. Veremos se são consistentes com a novidade promissora.
Porém, já provavelmente não estarei cá para estender os dados de 1995 a um período
mais longo do que as duas décadas. Não poderei assim testemunhar se Pritchett
tinha razão com o DIVERGENCE, BIG TIME ou se pelo contrário as duas décadas de
1995 a 2015 não foram um fogacho inconsequente. Os benefícios para o mundo de uma
e outra situação não são obviamente os mesmos.
É por estas e outras que alguns economistas se dedicam a outro nível de
abstração que não esteja tão dependente do sortilégio das evidências. Mas será
isso uma consolação?
Curiosamente, Krugman refere-se ao tema e ao post do PIIE na qualidade de
curiosidade-intervalo no seguimento da patética era de Trump nos EUA (link aqui).
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