quarta-feira, 17 de outubro de 2018

O MAR MATOSINHOS, PROFISSIONAL E AFETIVO


(Estarei hoje no salão Nobre da Câmara Municipal, em Matosinhos, a apresentar uma proposta de reposicionamento do concelho na economia do Mar e a moderar um painel sobre os ativos de investigação para a economia azul. Uma rara oportunidade de combinar a dimensão profissional com a afetiva, pois cresci com uma forte identidade familiar com o concelho e nele ainda trabalho)

Já lá vão alguns anos, creio que antes da crise de 2008 e suas sequelas para o país, que coordenei um trabalho sobre a localização do chamado polo do Mar da Universidade do Porto em Matosinhos. Essa localização não é propriamente canónica pois envolve na parte sul do porto de Leixões a localização no já célebre Terminal de Cruzeiros do CIIMAR, um importante laboratório associado nas ciências marinhas, e na parte norte das antigas instalações da APDL de atividades de incubação UPTEC no âmbito a economia do Mar e do projeto TEC4SEA liderado pelo INESC TEC que cobre as atividades de robótica marinha e de exploração do oceano profundo.

Mais recentemente, foi-nos solicitado pela Câmara Municipal de Matosinhos algum trabalho de pensamento estratégico sobre o reposicionamento de Matosinhos no âmbito da chamada economia do Mar ou economia azul (Blue Economy). É esse material de reflexão e proposta estratégicas que apresentarei hoje, numa conferência MATOSINHOS, MAR DE OPORTUNIDADES, promovida pela Câmara Municipal que aparentemente representa o arranque do tal novo posicionamento ambicionado.

A matéria fascina-me, curiosamente não sendo eu um grande praticante das coisas marinhas (nado canhestramente e mal), a não ser o deleite de uma boa caminhada pelo nosso paraíso costeiro (apesar do LESLIE) e pelas delícias gastronómicas do bom peixe, sobretudo no SALTA O MURO, o tal restaurante que embora não frequente todos os dias me oferece a sensação de ser bem recebido como se fosse um cliente diário. O fascínio resulta da grande valia da investigação científica que o mar tem suscitado a norte e da experiência afetiva e pessoal que Matosinhos sempre me proporciona, por razões familiares e de uma juventude que se cruzou fortemente com esta terra e obviamente com o mar, nos tempos em que as férias eram férias pela sua duração.

O interesse do município em reposicionar-se no âmbito da economia do Mar, por mais interrogações e frustrações que ela nos proporcione, dada a intermitência da vontade política de ir além dos documentos, é inteligente. Como direi hoje à tarde, tradição e localização não bastam para um posicionamento competitivo de Matosinhos nestas matérias. Há prioridades europeias a que é importante dar resposta, apesar de todas as intermitências a nível político nacional. Vários municípios costeiros estão a posicionar-se. E sobretudo porque são identificáveis dinâmicas privadas, empresariais e da sociedade civil, entre as quais a própria dinâmica do cluster do Mar, a que o meu amigo Rui Azevedo tem dado um relevante contributo de inteligência e persistência. Ora, todas estas dinâmicas impactam de um modo ou outro o território de Matosinhos.


A proposta de reposicionamento sintetizada no esquema gráfico acima reproduzido foca-se na valorização integrada de quatro ativos de Matosinhos, que combinam tradição e modernidade, fertilizando-se mutuamente.

Os ativos específicos são:

  • O polo de atividades de investigação e transferência de conhecimento e tecnologia;
  • O Porto de Leixões e as atividades logísticas associadas;
  • A modernização e inovação da pesca e da indústria conserveira;
  • As novas procuras de turismo e lazer.
Este core é dinâmico e ganha-se ou perde-se do ponto de vista das combinações virtuosas que é necessário construir no seu interior. E também a gestão política de possíveis contradições que as trajetórias de desenvolvimento.

Três exemplos ajudam a esclarecer este meu ponto.

Existe hoje um possível conflito, reitero possível e carecendo de investigação mais aprofundada, entre o prolongamento do molhe sul do porto de Leixões para melhor proteção e margem de manobra no seu interior e as atividades de ensino do surf na praia de Matosinhos. Surgiram argumentos de que o prolongamento do molhe pode alterar as condições do mar consideradas ótimas para o ensino do surf e estas assumem já um protagonismo relevante na orientação do concelho para os desportos marinhos.

Um outro exemplo radica no possível conflito que pode existir entre a estratégia da APDL para valorizar o seu modelo de negócio portuário e as necessidades de crescimento das atividades de I&D localizadas no porto de Leixões: o CIIMAR cuja localização no Terminal de Cruzeiros será eventualmente impactado pela eventual privatização da gestão do Terminal; as atividades mais diretamente ligadas à robótica marinha e à engenharia oceânica que necessitam, a norte, frente de mar para as suas atividades de teste e exploração de protótipos e que as podem ver obstaculizadas pelas necessidades de operação eficiente do próprio porto.

Finalmente, face às fortíssimas necessidades de espaço para a contentorização, o Porto de Leixões poderá eventualmente equacionar relocalizações possíveis para o porto de pesca, com impacto nesta opção de reposicionamento e obviamente com impactos urbanos consideráveis.

Por tudo isto, no reposicionamento proposto (ver esquema apresentado) é necessário operacionalizar um conjunto de dimensões transversais de intervenção, das quais me permito destacar a que para mim é a mais importante de todas: o município tem de liderar a governança do que poderíamos designar de estratégia de eficiência coletiva local, com as seguintes dimensões: (i) ajudar a Universidade do Porto a federar os seus próprios recursos em matéria de economia azul e projetar a sua influência plena no polo do Mar; (ii) a parceria estratégica com a APDL, com uma dupla vertente: o polo do Mar da UP e a relação município-Porto de Leixões; (iii) o próprio modelo organizativo do município para assumir essa responsabilidade de liderança; (iv) o protagonismo ativo do Município na dinamização do cluster do Mar, representado pelas atividades do Fórum Oceano localizado também no polo do Mar; (v) a criação de um Conselho Municipal para a Monitorização da própria estratégia de reposicionamento.

A Presidente Luísa Salgueiro e o vice-presidente Eduardo Pinheiro têm muito em que aplicar a sua energia e inteligência política.

Apareçam.



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