quarta-feira, 10 de outubro de 2018

INCURSÕES ERRÁTICAS E DE PURO GOZO PELO NOBEL



(Não escondo que a atribuição do Nobel a William Nordhaus e a Paul Romer me encheram de júbilo, fazendo-me reencontrar com a economia que sempre apreciei e contribuindo para menosprezar uma grande parte do mainstream que por aí se ensina, em circuito fechado, como se a sociedade e os seus problemas fossem uma ficção. Por isso, tenho andado deliciado a dar conta da reação da blogosfera económica à decisão sueca e principalmente a redescobrir e a reler algumas preciosidades dos dois autores.)

Quanto à reação da blogosfera económica à escolha de Nordhaus e Romer ela é genericamente de apreço e até de júbilo pela notoriedade mais do que merecida que a atribuição do Nobel garantirá às áreas de investigação dos dois economistas americanos. Não me consta que Lucas e Prescott (alvos recentes do rigor crítico de Romer quanto aos maus caminhos da macroeconomia) se tenham ainda pronunciado e provavelmente nunca o farão (embrulhem!). A junção dos dois economistas no reconhecimento da economia sueca foi olhada com alguma curiosidade e surpresa. Mas essa surpresa desvanece-se rapidamente lendo com atenção a excelente comunicação da academia sueca que deveria constituir a partir de agora matéria de leitura obrigatória em todos os cursos elementares e avançados de macroeconomia do crescimento económico (ver link aqui).

Graças ao labor insano de Mark Thoma e do seu Economist’s View, é relativamente fácil anotar aqui o que vale a pena ler em matéria de reação ao Nobel deste ano. Para a grande progressão do conhecimento o estar apoiado nos ombros dos gigantes é fundamental, como o dizia Newton, um dos grandes. Mas para a progressão quotidiana e não disruptiva do conhecimento, o trabalho de gente como Mark Thoma é também, à sua escala e projeção, não menos fundamental. O Economist’s View tem representado para mim horas e horas de aumento de produtividade de leitura e pensamento e aqui fica o meu modesto e singelo tributo a quem trabalha tanto para os outros, a partir do Oregon – USA. Por isso, considero que a blogosfera económica revolucionou a produção de conhecimento em economia, repito, a que não funciona em circuito fechado.

Ora, seguindo o trabalho notável de Mark Thoma, refiro para já dois artigos muito sugestivos de Tyler Cowen no Marginal Revolution (links aqui para Nordhaus e aqui para Romer). São artigos sugestivos porque sobretudo enquadram a obra dos dois economistas em contextos de vivência e progressão académica muito abrangentes e por isso preciosos para completar a própria citação da academia sueca. Ajudam-nos a encontrar uma lógica no desenvolvimento prodigioso dos curricula dos dois investigadores, cuja leitura recomendo vivamente, mas que o devemos fazer com defesas reforçadas quanto à perceção de que o tempo para alguns não deve ter as mesmas coordenadas do nosso. Como é possível escrever tanta coisa e tanta coisa decisiva e importante em praticamente sessenta anos de vida para cada um? Este domínio do tempo pelos Grandes sempre me fascinou.

Tim Taylor, no também aqui muitas vezes mencionado Conversable Economist, aproveita para puxar dos galões do seu estatuto de editor de uma das mais estimulantes revistas académicas de economia, o Journal of Economic Perspetives, para mostrar como os dois laureados publicaram na revista coisas bem importantes (link aqui).

Joshua Gans (link aqui), no DIGITOPOLY, publica uma das mais incisivas peças sobre os laureados, situando-se nos obstáculos (colocados essencialmente pelo sistema reprodutivo do mainstream e do establishment administrativo e político). A importância do tema vale uma citação: “Lá atrás nos anos 80, quer a política climática quer a ciência/política de inovação enfrentavam barreiras significativas para se desenvolverem. Nos dois casos, os principais responsáveis que conduziam tais políticas eram economistas que tinham sido treinados com manuais tradicionais de economia e que exerciam uma poderosa influência nos governos pelo facto de manejarem habilmente a argumentação. No caso da política climática, enquanto que a ciência puxava para a ação, a grande interrogação consistia no custo económico da mitigação da emissão de gases com efeito de estufa. No caso da política de inovação, embora os custos fossem conhecidos, o grande problema era conhecer a dimensão do retorno. Por isso, para cada uma das políticas, os economistas que tinham ganho a aposta para análise custo-benefício no governo, estavam em condições – em alguma medida de modo pertinente – que em cada caso um lado da equação estava ausente. A minha opinião pessoal é que a incerteza não pode ser necessariamente uma barreira para a ação, mas quando se trata de mexer com o apoio à decisão política a incerteza é uma arma que pode ser usada por interesses particulares para gerar a inação e ao tempo os economistas eram talvez involuntariamente portadores dessa arma”.

Brilhante e evidenciando bem a importância dos contributos de Nordhaus e Romer apesar e contra esses obstáculos.

Kevin Bryan no A FINE THEOREM situa os contributos dos dois laureados nas raízes mais profundas da economia política, remontando ao estudo da riqueza das nações por Adam Smith (link aqui).

Finalmente e por agora. BRAD DELONG dedica aos dois laureados uma aula sob a forma de uma estimulante apresentação, como é timbre deste Professor de Berkeley (link aqui) .

Outros testemunhos virão e perante tal diversidade a tentação é redescobrir os dois autores, revendo leituras de outras épocas, que também é uma forma de recordações pessoais.

Para hoje, trago duas curiosidades relativas a Nordhaus e uma meta-ideia de Romer que me acompanhou em todo o trabalho docente sobre economia da inovação.

Quanto a Nordhaus, pouca gente saberá que o economista americano está ligado como corresponsável de investigação a uma das mais curiosas ideias de estudo do crescimento económico por métodos indiretos. Combinando a utilização de mapas de luzes noturnas em diferentes países com outras estatísticas, Nordhaus e um investigador chinês Xi Chen exploraram um método que tem aplicação sobretudo em economias de base estatística mais rudimentar. A imagem que abre este post tem origem nessa investigação. A outra preciosidade foi para meu júbilo aqui por mim comentada neste blogue, mais propriamente em 15 de setembro de 2015. É um artigo de Nordhaus para a Cowles Foundation, publicado na NBER (link aqui), sobre as relações entre as tecnologias de informação e a inteligência artificial e o crescimento económico. Considero que é das reflexões mais apaixonantes sobre os efeitos da inteligência artificial e aqui oportunamente o documentámos, como bom registo deste modesto blogue (link aqui).

Quanto a ROMER fico-me por hoje por esta meta-ideia de 2015:

Todas as gerações perceberam os limites do crescimento que recursos finitos e efeitos colaterais indesejáveis tenderão a determinar se novas fórmulas ou ideias não forem descobertas. E todas as gerações subestimaram o potencial para encontrar novas fórmulas e novas ideias”.

Definito e decisivo. Fiquem bem.

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