quarta-feira, 31 de outubro de 2018

MUITO NEGRO É...


Habituei-me a ter uma certa consideração política por Fernando Negrão, um cidadão com carreira e com toda a aparência de ser alguém dotado em termos de conteúdo. Mas o certo é que não sei o que lhe deu para que se tenha decidido a prestar-se a algumas tristes figuras, que de todo só o desmerecem. Já tinha sido o caso aquando da sua frustrada candidatura à presidência da Assembleia da República, tem sido pontualmente o caso em debates quinzenais e foi hoje o caso no debate sobre o Orçamento de Estado ao comando do grupo parlamentar do PSD. Vejamos algumas das suas mais desclassificadas pérolas: “Um Orçamento assim tem um nome: é um Orçamento fake, é um orçamento falso. Um embuste, um logro ou, em bom português, uma aldrabice.” Ou:“Este modo socialista de fazer as coisas é normalmente acompanhado por uma frase e cito: ‘nunca houve tanta transparência nas contas públicas portuguesas’. Disse-o Sócrates em 2010 e di-lo hoje António Costa.” Ou, ainda: “Neste jogo de sombras, temos sempre o primeiro-ministro, Dr. António Costa, a controlar este seu teatro de marionetas, julgando que, desta forma, consegue igualmente manipular os portugueses.” O debate política tem as suas lógicas, que consabidamente incluem a demagogia e a berraria como algumas das principais ferramentas, mas Negrão exagerou manifesta e desnecessariamente, sobretudo se o seu objetivo era – como devia ser – o de procurar chamar a atenção dos portugueses para algo do que, a seu ver, vai mal na estratégia governativa. É verdade que alguns dos seus adversários também não se fizeram rogados na utilização de uma argumentação desproporcionadamente descentrada e demagógica, como aconteceu com Carlos César – fui particularmente sensível àquela ideia brilhante de que, apesar de a oposição acusar o governo de Portugal de ter um baixo crescimento, “em 2015 a Irlanda cresceu 14 vezes mais que Portugal e no próximo não chegará ao dobro”! – ou com a provocadora intervenção final de Vieira da Silva, mas quem é que ainda não entendeu que a melhor forma de combater a deselegância da palavra fácil e gratuita tende cada vez mais a ser a elegância da palavra medida e fundamentada?

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